Saúde mental e desenvolvimento social: as maiores faturas pagas pelos alunos com NE após a pandemia
Jorge Humberto Nogueira
I Dirigente Sindical, Educação Especial I
Na avaliação da Educação Especial, fica claro que o confinamento, as regras de distanciamento, o isolamento social e o medo, aumentaram os problemas de saúde mental de crianças e adolescentes, para além de afetar as aprendizagens. A UNICEF (2021) estima que mais de um em cada sete crianças e jovens, dos 10 aos 17 anos, sofre de problemas emocionais e que serão necessários muitos anos e investimento significativo para os resolver.
A mesma entidade refere que no caso dos alunos com perturbações no desenvolvimento, esse preço foi maior, dado que despoletou ou agravou muitas das situações de déficit de atenção com hiperatividade, ansiedade, autismo, transtorno bipolar, transtorno de conduta, depressão, transtornos alimentares, deficiência intelectual e esquizofrenia.
Um outro aspeto negativo é o défice de experiências de socialização, de acesso aos contextos naturais e a atividades sociais, bem como aos grupos de referência; fundamentais para uma construção da personalidade, identificação e desenvolvimento de capacidades, quer na escola, como fora dela, onde a pobreza e a língua materna, quando associados, agravaram mais as desigualdades gritantes que se verificaram.
No caso de crianças com deficiência intelectual, transtornos de aprendizagem ou perturbações da comunicação e comportamento, tudo se agrava, devido a uma maior necessidade dessas vivências para o seu desenvolvimento. O isolamento, o acesso muito deficitário às aprendizagens e todo o afastamento promovido, não permitiram um crescimento adequado nessas áreas, no período etário ótimo para tal.
Mesmo no ensino a distância, os alunos com necessidades específicas não tinham autonomia, nem competências digitais para participar e as famílias não puderam compensar.
Na área da Inclusão e da Educação Especial o desenvolvimento da autonomia, da comunicação, da motricidade e da área socio emocional, constituem a maior fatura paga por estes alunos.
Para além de toda a aprendizagem em contexto perdida, que é a mais rica e eficaz, foram também postas em causa competências básicas comportamentais que predispõem para a aprendizagem, bem como a leitura, a escrita, a manipulação, a realização de atividades práticas e funcionais, ou o acesso ao lúdico.
Neste momento torna-se fundamental um reforço de meios e ações para implementar respostas de equidade, não só para o insucesso e défices na aprendizagem, mas também para o apoio psicossocial.
O Plano de Recuperação ficou muito aquém do necessário face ao diagnóstico traçado e o anúncio da sua continuidade é contraditório com a diminuição de crédito horário e a dificuldade em dispor de AO, entre outros recursos necessários.
Não podemos ter um investimento remediativo pontual, mas sim uma aposta estrutural, continuada e consistente, em recursos e áreas como:
Professores Especializados; Psicólogos; Terapeutas, Assistentes Sociais e Assistentes Operacionais, para reforçar os processos de inclusão e aprendizagem, de saúde mental e de competências na área social.
Equipas multidisciplinares como o CRI, devem estar inseridas nas estruturas do ME e não ser contratualizadas externamente sem ligação às dinâmicas pedagógicas. Em vez de investir na inclusão em ambiente escolar, o Estado financia a exclusão.
Equipas de Intervenção Precoce, fundamentais para o apoio nos primeiros anos de vida, mas que não dão resposta às solicitações, padecendo de falta de meios e recursos.
Crédito horário reforçado para apoios, parcerias e coadjuvações, no âmbito das dificuldades de aprendizagem decorrentes da diversidade linguística e cultural, bem como constrangimentos sociofamiliares, económicos ou outros.
Redução do número de alunos por turma e classes de um só ano, para permitir um trabalho mais individualizado e mais tempo de permanência em turma dos alunos com NE.
Texto original publicado no Escola/Informação Digital n.º 41 | Outubro 2023