Artigo:Pela valorização e dignificação da função docente

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Pela valorização e dignificação da função docente

José Feliciano Costa
I
Presidente da Direção Central do SPGL I


Reiterar a necessidade da reivindicação de um esforço financeiro para a educação é imperativo e, por isso, nunca abdicámos da exigência dos 6% do PIB para a Educação. A resolução dos principais problemas que afetam a educação e aos seus profissionais deve-se exclusivamente a um financiamento desadequado e essa, já percebemos, é claramente uma opção política.

Em agosto de 2022, a FENPROF entregou no Ministério da Educação um Protocolo Negocial com o objetivo de, durante esta legislatura, se tentar resolver os principais problemas que afetam as escolas e os seus profissionais. 

A recomposição da carreira, as condições de trabalho dando enfoque aos horários mas também às questões da burocracia, o criar de condições para um regime justo de aposentação, o fim da precariedade, um justo regime legal de concursos, o fim deste punitivo regime de avaliação de desempenho e a sua transformação num processo formativo e não punitivo, a formação contínua e a formação inicial de professores, e também questões específicas dos vários setores e ciclos de ensino que, pelas suas especificidades de organização e funcionamento, têm problemas muito concretos, desde a Educação Pré-Escolar ao Ensino Superior, tanto no ensino público como no privado e cooperativo.

É objetivo deste dossier analisar, em cada um dos setores e níveis de ensino, algumas das suas questões específicas, mas enquadradas num plano mais geral, de nítida desvalorização da profissão docente, sendo que este tem sido um dos objetivos comuns partilhados por vários governos com o claro propósito de embaratecer o trabalho docente.

Isto num quadro que se vai substancialmente agravando e que marca de forma muito negativa a vida e a condição profissional dos professores, educadores e investigadores em Portugal.

Uma precariedade laboral que se prolonga até quase aos 50 anos, uma carreira em que a meritocracia impede o reconhecimento do valor e da qualidade do trabalho realizado, uma avaliação regida por critérios administrativos, cujo objetivo é claramente impedir a progressão na carreira. Para esse desiderato, utiliza-se um perverso modelo de avaliação punitivo municiado por quotas e vagas. Um corpo docente envelhecido, desgastado também por uma enorme carga de burocracia inútil e pela sobrecarga de trabalho, que é resultado de horários que ultrapassam todas as margens da legalidade e, ainda, pelo exercício de um poder hierárquico que resulta de um modelo de gestão de escolas profundamente antidemocrático. 

 

É importante exigir a realização de negociações politicamente sérias que permitam:

  •  o fim do processo de municipalização imposto, numa clara opção política que o descompromete do Estado central no que respeita ao financiamento da educação pública; 
  •  o reafirmar da necessidade de estruturar um modelo de organização da escola numa perspetiva de participação democrática, inserindo-o num contexto de descentralização, de que resultem claros os poderes a ser exercidos aos diferentes níveis, incluindo o nível local e o nível da escola;
  •  a desagregação dos mega agrupamentos que desumanizam a vida das escolas contribuindo para o fim de uma gestão de proximidade, tanto em relação a alunos e docentes como às famílias, o que potencia situações de indisciplina e violência na escola, com o aumento da população escolar e o afastamento dos seus órgãos dirigentes; 
  •  o reforço dos recursos humanos e materiais das escolas, condição indispensável para garantir respostas adequadas para todos os alunos, incluindo o fortalecimento do apoio pedagógico acrescido que deverá ser prestado a todos os que dele necessitem; 
  •  a valorização do ensino profissional que não pode ser o parente pobre das vias científicas e humanísticas. Terá de ser uma resposta predominantemente pública, valorizada na oferta curricular, financiada, em primeira linha, por dinheiros públicos e libertada de condicionamentos impostos;
  •  o reconhecimento da educação inclusiva como uma prioridade, tornando as escolas verdadeiros espaços de inclusão; 
  •  a valorização dos profissionais docentes e dos investigadores, nomeadamente através da valorização das suas carreiras, que se encontram profundamente degradadas;
  •  o fim do perverso mecanismo do bloqueio de progressões, a que se somam incumprimentos, ultrapassagens e, até, os roubos de tempo de serviço cumprido; 
  •  o combate à precariedade, sendo que a realidade demonstra que os concursos extraordinários de vinculação realizados e a designada norma-travão que consta do regime de concursos, ainda que com as limitadas melhorias que lhe foram introduzidas, não resolveram o problema da precariedade laboral e não responderam às necessidades permanentes das escolas. 

Os setores têm, obviamente, os seus problemas específicos, o que acrescenta razões à necessidade de intensificar a atividade setorial. No entanto, a maioria dos ataques são transversais, atingindo vários ou todos os setores, ainda que por vezes com especificidades.

Independentemente de ser exercida no sistema público ou no sistema privado ou social, cuja concretização não é, de todo, indiferente face às condições laborais em que é exercida, o objetivo é apresentar neste documento uma perspetiva das propostas que a FENPROF e os seus sindicatos apresentam para a valorização e dignificação da função docente.

Texto original publicado no Escola/Informação n.º 305 | Setembro 2023