Artigo:Outras guerras — o rastilho turco nos conflitos em África

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Outras guerras — o rastilho turco nos conflitos em África

O Presidente Recep Erdogan tem desenvolvido a indústria militar turca, no seguimento da sua política de afirmação da Turquia como potência regional independente da NATO e do Ocidente. Erdogan, que desconfia profundamente da Aliança Atlântica e das intenções dos seus parceiros ocidentais, quer tornar a Turquia independente também do ponto de vista militar e já fabrica carros de combate, metralhadoras, drones, e mesmo aviões. Os drones turcos,  produzidos por uma empresa gerida pelo genro de Erdogan, são os mais eficazes que se produzem hoje. A essa superioridade tecnológica acresce a vantagem de serem mais baratos e mais fáceis de utilizar que os drones americanos e israelitas. Estes drones têm tido muito êxito nalguns teatros de guerra onde a Turquia interveio recentemente. No conflito entre a Arménia e o Azerbaijão, os drones turcos foram decisivos na vitória dos azeris, e também na Líbia estas armas permitiram às forças governamentais repelir as investidas dos rebeldes. 

Tem-se verificado uma apetência crescente dos países africanos por este armamento. Houve recentemente uma feira de material militar na Turquia e acorreram várias delegações africanas muito interessadas.

A consolidação da influência turca em África também se faz de relações bilaterais que já se traduzem em 43 embaixadas turcas em outras tantas capitais africanas, quando ainda em 2009 eram apenas 12, e em voos da Turkish Airlines para mais de 50 destinos em 33 países africanos, último dos quais Luanda (duas vezes por semana, desde Outubro), com a promessa da abolição dos vistos entre os dois países. O Presidente João Lourenço também prometeu comprar os eficazes drones.

Os drones turcos já foram vendidos a Marrocos e à Tunísia e estão a ser negociados com o governo etíope, que certamente os usará contra os movimentos secessionistas, em especial na guerra aberta com o Tigré. A Turquia já vendeu carros de combate ao Uganda e metralhadoras a alguns países do Sahel, como Níger, Chade e Burquina Fasso.  A pegada militar turca em África é cada vez maior.

A venda do armamento turco aos países africanos é feita à maneira chinesa, com contratos celebrados de modo simplificado e rápido, comparando com a prática europeia e ocidental, ou seja sem respeito pelos direitos humanos ou políticos e evitando sanções por não serem cumpridas essas condições. O exemplo mais ilustrativo é a venda de drones à Etiópia, apesar do regime etíope ter sido acusado de cometer crimes de guerra contra os rebeldes do Tigré.

A França e os rivais regionais da Turquia (Arábia Saudita, Egipto e Emirados Árabes Unidos) estão preocupados com esta ascensão turca no continente africano e tentam contrariá-la. A França vê-se ultrapassada pela Turquia na relação com o Senegal e com os países do Sahel, que enfrentam uma onda de terrorismo fundamentalista islâmico. E no conflito latente entre a Etiópia e o Egipto, por causa da construção da Grande Barragem da Renascença Etíope no Nilo superior, que irá pôr em causa o modo de vida de milhões de egípcios, Erdogan apoia a Etiópia. Com esta estratégia, a Turquia visa superar a aliança entre Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Egipto na liderança do mundo islâmico.

Francisco Martins da Silva