Artigo:Garantir condições para uma formação de qualidade e o reconhecimento da habilitação profissional para a docência

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Garantir condições para uma formação de qualidade e o reconhecimento da habilitação profissional para a docência

Jorge Gonçalves | Vice-Presidente SPGL

O regime jurídico de habilitação profissional para a docência na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, aprovado em 2014, veio estabelecer as condições específicas de ingresso nos mestrados existentes na altura, mas desde então já sofreu alterações em vários momentos, mas sem isso significar valorização e qualidade na formação inicial de educadores e professores. Apesar de assumir que “as melhores práticas e o robusto conjunto de estudos internacionais e de dados recolhidos sobre estas matérias apontam consistentemente para a importância decisiva da formação inicial de professores e para a necessidade de essa formação ser muito exigente, em particular no conhecimento das matérias da área de docência e nas didáticas respetivas”. Não foi esta a realidade à altura e também ainda não o é.

Já em 2022 se tinha seguido o caminho da redução da exigência habilitacional para o exercício da docência com habilitação própria, com vista à facilitação da contratação de escola. Depois, o anterior governo deu o passo seguinte adotando as habilitações próprias estabelecidas para os cursos pós-Bolonha, para ingresso nos mestrados que conferem habilitação profissional. Quando o anterior governo apresentou a proposta de terceira alteração ao regime jurídico de habilitação profissional para a docência, mais uma vez não veio contribuir para a sua melhoria. É certo que, com o objetivo de atrair à profissão docente mais candidatos, introduziu regras específicas para a aquisição de habilitação profissional para a docência e novamente os estágios remunerados. Mas não respondeu à questão essencial de voltar a ter um modelo que garantisse a qualidade na formação de professores e nem os estágios remunerados chegaram a ser operacionalizados. Mais uma vez, sem discussão alargada e participada.

Quanto à existência de estágios remunerados, o SPGL e a FENPROF defenderam que os professores estagiários fossem tratados como docentes, desde logo em relação à sua responsabilidade sobre as turmas atribuídas, mas também ao contrato de trabalho a celebrar com o Ministério da Educação, ao salário e à consideração do tempo de serviço para todos os efeitos. Já os orientadores de estágio deveriam ter condições para o exercício desta importante função, com direito a uma redução de componente letiva para responder à exigência da função. Mas não era essa a intenção, mas apenas e sem sucesso dar resposta ao problema da falta de professores.

Já com este governo foi anunciada a quarta revisão do regime jurídico da habilitação profissional para a docência. Se era positiva a intenção declarada de separar as questões da formação do problema da existência de alunos sem aulas, isso não justificava a retirada do enquadramento dos estágios remunerados ou a desvalorização dos professores orientadores. Mais uma oportunidade perdida, acompanhada de perspectivas de retrocesso.

Como nenhuma das alterações resultou de uma profunda reflexão e alterações estruturais, ficaram também, mais uma vez, por resolver questões de reconhecimento de habilitações, em particular com critérios diferentes para formações pré e pós-bolonha, assim como, obstáculos no acesso aos mestrados em ensino e condicionalismos no reconhecimento da qualificação profissional para a docência obtida no estrangeiro.

No concurso externo extraordinário, realizado em 2024, dos 1822 docentes colocados, 893 (49%) tinham habilitação própria, ficando com nomeação provisória e tendo que fazer a profissionalização no prazo de 4 anos. Também nestes casos é necessário assegurar os mecanismos que permitam a sua profissionalização, com soluções assumidas pelo próprio Ministério e compatíveis com a manutenção do exercício da docência.

O atual contexto de falta de professores não pode ser justificação para desvalorizar a formação de professores e o reconhecimento da habilitação profissional para a docência. Pelo contrário, deve ser uma oportunidade para valorizar a formação dos que já hoje exercem e atrair novos educadores e professores. Naturalmente, estes aspetos não podem também ser desligados da luta de todos os dias pela necessária valorização da carreira docente e o investimento na Escola Pública. 

Texto original publicado no Escola/Informação n.º 310 | janeiro/fevereiro 2025