Num debate muito participado por um público de professores e representantes de sindicatos, organizações e entidades, incluindo a CONFAP e o Conselho Nacional da Educação, presidido pelo secretário-geral da FENPROF Mário Nogueira, com a presença na mesa de representantes dos vários grupos parlamentares, o encontro "A Educação e os Imperativos Constitucionais" abordou a história e a realidade atual da construção e aplicação da Constituição da República Portuguesa no domínio da educação.
No encontro que decorreu em Lisboa, no Hotel Marquês de Sá, no passado dia 2 de Abril, tiveram a palavra pelos grupos parlamentares Miguel Tiago (PCP), Luís Fazenda (BE), Pedro Alves (PS), Isilda Aguincha (PSD) e Michael Seufert (CDS/PP), num debate em que estiveram em foco o processo histórico de elaboração e alterações da constituição e o modo como está a ser, ou não, aplicada na esfera essencial da escola pública, do ensino e da formação.
Foram abordados os domínios abrangidos pela nossa lei magna como a gratuitidade, a igualdade de oportunidades, a formação e o acesso a todos os níveis de ensino, considerando aspetos e realidades atuais como o financiamento e as propinas, o ensino dual, os mega-agrupamentos e a orientação do ensino para o conhecimento, desenvolvimento da personalidade e a formação democrática e/ou para o mercado de trabalho.
A abrir o encontro, Mário Nogueira salientou que a FENPROF não poderia passar ao lado dos 37 anos da Constituição e a necessidade de a defender, "contrariando práticas que a contrariem", apontando exemplos como o dos mega-agrupamentos e a recente criação de mais 18, o sub-financiamento e a perda de professores.
Luís Fazenda abriu a ronda de intervenções dos deputados com a questão do financiamento e das propinas e dois casos significativo: a afirmação do ex-ministro da Educação, Marçalo Grilo, de reconhecimento de que já na altura em que lançou as propinas saber que na realidade era inconstitucional e a realidade de os 25% de cofinanciamento admitidos como constitucionais estarem presentemente a serem transgredidos. O acesso a todos os níveis de ensino, contrariado pela proposta de ensino dual e a necessidade de um sistema público para todos os tipos de ofertas foram questões igualmente abordadas.
Miguel Tiago apontou como instrumentos essenciais e obstáculos a políticas dos últimos anos a Constituição e a Lei de Bases do Sistema Educativo, salientando como os princípios constitucionais com os quais o PCP converge, expressos nos artigos 73º e 74º, de igualdade de oportunidades e da importância da formação e promoção do pensamento, não são os do mercado capitalista que promove mais assimetrias e não estão a ser cumpridos presentemente pelo Estado, nomeadamente com a escola dual e ao gerar maior abandono escolar.
Michael Seufert abordou o processo histórico da Constituição, referenciando como o CDS/PP foi o único partido que votou contra a Constituição de 76 e que hoje a Constituição tem problemas, mas não na área da educação. Considerando que os princípios constitucionais na área educativa não estão a ser colocados em causa, apontou como fator essencial de formação a qualificação de pais e professores.
Pedro Alves avaliou que a Constituição sofreu poucas alterações no setor da educação, desde 76, e que já a Constituição de 1911 fazia uma aposta essencial na educação, interrompida em 1926, gerando um atraso só recuperado com a Constituição de 1976. Avaliando a situação atual considerou que havendo embora consensos quanto ao texto da Constituição o rumo de concretização se afasta das tarefas exigidas pelos seus artigos 73º e 74º, criticou a poupança de recursos e a importação direta do ensino dual da Alemanha, considerando embora este ter vantagens evidentes.
Isilda Aguincha afirmou que a Constituição nos dá ferramentas de base para levar educação para todos, e integrou as orientações atuais da política educativa no presente momento difícil do país, defendendo o ensino dual como forma de melhor integração no mercado de trabalho e os mega-agrupamentos como fatores de agregação.
No debate foram criticados os mega-agrupamentos por passarem alunos de pessoas a números, o ensino dual como recuperação do ensino segregador, levantadas as questões dos despedimentos de professores face ao aumento da escolaridade obrigatória e aos números de alunos apontados pela OCDE, do empobrecimento escolar, da necessidade de uma rede de ensino pública. Destacou-se também a voz da deputada constituinte Carmelinda Pereira que relatou como o processo de elaboração da Constituição, em que esteve envolvida foi feito com organizações, pessoas, escolas, empresas para a formação de uma Constituição programática, prática.
Mário Nogueira concluiu em tom de síntese haver consenso quanto à importância da Constituição da República mas também diferentes perspetivas sobre o que significam medidas em curso e se estas estão ou não a respeitar a Constituição.
Sofia Vilarigues
Fotos: Paulo Machado