Artigo:A recuperação das aprendizagens dos nossos alunos exige medidas de emergência

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A recuperação das aprendizagens dos nossos alunos exige medidas de emergência

Sandra Lemos
I Dirigente Sindical, 1.º CEB I

O Plano de Recuperação das Aprendizagens, que ficou conhecido como Plano 21|23 Escola+, foi pensado para atenuar as consequências da pandemia da covid-19 nas aprendizagens, nos conhecimentos, nas capacidades e nas atitudes, bem como nas condições de bem-estar emocional e mental dos alunos. Foi assim apresentado um conjunto de medidas que, segundo a tutela, se alicerçavam em políticas educativas, com eficácia demonstrada, ao nível do reforço da autonomia das escolas e das estratégias educativas diferenciadas, dirigidas à promoção do sucesso escolar e ao combate às desigualdades através da educação.

Na realidade este plano colidiu numa série de obstáculos, o mais grave de todos, o decréscimo do número de professores a lecionar nas escolas. Nos últimos anos nada foi feito para atrair jovens para a profissão e, em relação aos que já se encontravam integrados, continuou o impedimento da progressão na carreira, quer devido ao regime de quotas na avaliação, quer com a imposição de vagas para a progressão a determinados escalões. Fragilizou-se o setor, com a velha desculpa economicista, com prejuízo de uma Escola Pública de qualidade, fomentadora de equidade e do desenvolvimento dos alunos.

Deste plano também não fizeram parte medidas imprescindíveis para a sua implementação, desde logo turmas mais pequenas para um ensino que se pretende mais individualizado, mais professores para trabalho de coadjuvação, reforço das equipas multidisciplinares (com psicólogos, técnicos e terapeutas), mais apoios pedagógicos para alunos com necessidades educativas especiais e horários pedagogicamente adequados, com mais tempo para os professores dedicarem aos seus alunos e livres de burocracias excessivas.

Importa recordar que o relatório referente à auditoria realizada pelo Tribunal de Contas ao Plano 21/23 Escola+, apesar de reconhecer o reforço de alguns recursos a ele associados, identifica um conjunto de insuficiências relacionadas com os objetivos, monitorização e financiamento. Menciona ainda prioridades pouco claras, insuficiente afetação de recursos, excessivo número de ações e inexistência de metas e de indicadores para efeitos de monitorização e avaliação. 

Não obstante, o governo prolongou, por mais um ano, o plano de recuperação das aprendizagens, afirmando a vontade em reforçar as equipas multidisciplinares e os planos de desenvolvimento pessoal, social e comunitário. Ora, se a principal crítica da comunidade educativa a este plano tem sido a insuficiente concessão de recursos para a implementação das medidas inicialmente anunciadas, sendo agora o crédito horário atribuído às escolas reduzido, o plano torna-se obviamente impraticável. A opção pela dependência de financiamentos externos, em lugar da afetação de verbas do orçamento do Estado para o funcionamento das escolas, é uma opção política com claras consequências para a qualidade do ensino.

Finalmente, para acentuar as dificuldades em implementar medidas que permitam a recuperação de aprendizagens, surge a questão das habilitações dos professores. A decisão do ministério em baixar a habilitação para o acesso à docência, procurando resolver o problema da falta de professores, não contribui para as necessidades das escolas que precisam de docentes cada vez mais habilitados, a nível científico e pedagógico.

Um sistema de ensino em constante degradação, sem reforço do investimento desde há vários anos, colocado em segundo plano, permite que Portugal seja um dos países menos alfabetizados da Europa. A recuperação das aprendizagens dos nossos alunos exige medidas de emergência para dotar a Escola Pública de quadros de professores, técnicos e outros profissionais que garantam a qualidade na educação e o desenvolvimento das crianças e jovens. Teremos de assumir o investimento na Escola Pública como a prioridade que há muito deixou de ser.

Texto original publicado no Escola/Informação Digital n.º 41 | Outubro 2023