Artigo:A cegueira da monodocência

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A cegueira da monodocência

João Barros
I
Coordenador do 1º CEB I

Nos últimos anos, em particular desde o mandato da ministra Maria de Lurdes Rodrigues, os professores têm vindo a ser desrespeitados. Longe vai o tempo em que ser professor era das profissões mais nobres e respeitadas.

No que diz respeito ao 1.º Ciclo parece haver, para além desta falta de respeito, um profundo desconhecimento sobre o que é a monodocência. Começando desde logo com o regime de aposentação: muitos professores, ainda no ativo com 65 anos ou mais, tinham a expectativa de se aposentarem por volta dos 55 anos, ou seja dez anos antes. Tudo isto porque as regras mudaram a meio do “jogo”, criando desmotivação, cansaço e sobretudo desalento. Claro que não nos esquecemos de outros assuntos mais atuais, como o que se passa por exemplo com o ponto 3 do artigo 79.º do Estatuto da Carreira Docente sobre a dispensa total da componente letiva aos 25 anos e aos 33 anos de serviço, que os professores podem requerer e que não lhes é concedida alegando inconveniência dos serviços ou até atribuindo 35 horas semanais, fazendo tábua rasa do previsto no ponto 7 do mesmo artigo. O mesmo acontece com o ponto 2 do mesmo artigo, que prevê que aos 60 anos os professores possam requerer a redução de 5 horas da componente letiva, mas existem interpretações, feitas de forma distorcida, com casos de professores que, não tendo turma atribuída, as direções das escolas elaboram os horários não respeitando a redução de cinco horas da componente letiva a que têm direito, mesmo tratando-se de professores em regime de monodocência. Há ainda casos em que esta redução da componente letiva lhes é concedida, por direito, mas obrigando-os a acompanhar no apoio educativo um grupo significativo de alunos, que achamos que não é nada mais que a continuação da componente letiva, mudando apenas o grupo de alunos que passam a ser outros que não os da turma que lhe foi atribuída.

Por outro lado, continuam algumas Direções de Agrupamentos a não respeitar horários no 1º Ciclo, excluindo o intervalo da manhã da componente letiva, obrigando os professores a uma carga letiva de 27,5 horas letivas semanais. 

Tudo isto feito com a conivência do Ministério da Educação e do Governo, uma vez que não faz chegar aos Agrupamentos orientações para que estes cenários não se repitam e cumpram o que está regulamentado. Não basta o desrespeito do Ministério da Educação para com os professores do 1.º Ciclo e dos restantes professores como temos também algumas Direções de Agrupamento a colaborar nesse mesmo desrespeito.

Muitos destes atropelos têm sido resolvidos devido à denúncia de alguns professores e com o apoio dos sindicatos como o SPGL e outros afetos à FENPROF. 

Os professores do 1.º Ciclo reivindicam também a redução do número de alunos por turma. Torna-se cada vez mais difícil lecionar turmas com tão elevado número de alunos. Acresce que os alunos chegam às escolas com mais problemas sociais, comportamentais e dificuldades de aprendizagem. Outros com dificuldades pelo facto de serem alunos de Português Língua Não Materna. Tudo isto sem que o professor tenha o apoio necessário para dar resposta a todas estas necessidades. Faltam professores de apoio, faltam professores com formação para dar apoio a  alunos oriundos de outros países. Para isso é necessário que o Ministério da Educação não reduza o número de professores nas escolas e aposte verdadeiramente na defesa da Escola Pública.

Mas as reivindicações não ficam por aqui. Não podemos esquecer que este Governo nunca nos deu nada sem a luta dos professores. As grandes conquistas devem-se a essas lutas, por vezes com conquistas aquém do esperado, mas que mesmo assim devemos valorizar. Não podemos parar de lutar e exigir a recuperação total do tempo de serviço assim como o fim das quotas para a passagem ao 5.º e 7.º escalão. Não podemos apenas “aspirar” a chegar ao topo da carreira, esse é um direito de todos nós.

Não podemos esmorecer. 

A luta continua.

Texto original publicado no Escola/Informação n.º 305 | Setembro 2023