Artigo:Trinta anos de Tratado de Maastricht

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Trinta anos de Tratado de Maastricht

Em 7 de fevereiro de 1992, foi assinado o Tratado de Maastricht que entrou em vigor em 1 de novembro de 1993. Este tratado instituiu a moeda única europeia, o euro, que Portugal adotou em 1 de janeiro de 1999.  É altura de fazermos um balanço destes trinta anos de integração na eurozona. Este não é de modo algum positivo, antes pelo contrário, embora alguns continuem a defender que estamos no bom caminho, na senda do progresso, que estaríamos pior se não tivéssemos feito esta opção que nem sequer foi sufragada por um referendo, tal como aconteceu na Dinamarca, que a rejeitou, enquanto na França foi aprovada à justa. Os factos desmentem-nos:

- segundo um estudo do FMI, a taxa de crescimento do país foi a 13ª mais baixa a nível mundial, desde esta integração, apenas superior à da Itália e à da Grécia, outras duas vítimas dos políticos sem visão estratégica que escolheram esta via (admiram-se, então, que, em Itália, a extrema-direita esteja no poder e o Chega cresça exponencialmente em Portugal?);

- a adesão ao euro contribuiu para um imparável processo de desindustrialização do país. Alguns dados confirmam-no:

- o  índice da produção industrial atingiu o valor máximo em 2002, não parando de cair desde essa data, no que foi acompanhado pela queda do emprego na indústria transformadora que caiu 20% entre 1986 e 2010 (Fonte: Mateus, Augusto – 25 anos de Portugal Europeu, Lisboa, Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2013, p. 105);

- segundo o Eurostat, Portugal foi o país da UE em que mais indústrias desapareceram desde 2005, com uma queda de 18,9%, a maior da Europa comunitária, cujas indústrias, em contrapartida, cresceram 13,9%,

- face a um euro sobrevalorizado relativamente ao escudo que desincentivou a inovação tecnológica que se concentrou nos países do norte e centro da Europa, as exportações portuguesas são ainda predominantemente de baixa e média-baixa tecnologia, 56,9% em 2019, apesar da situação ter melhorado sensivelmente no período de 2014-2019, pois a quota da alta tecnologia passou de 6,9% para 10,3% e a da médio-alta tecnologia de 29,9% para 32,8% (Fonte: GPEARI| GEE);

- segundo o economista Augusto Mateus, apesar do peso das exportações no PIB ter aumentado 20% nos últimos quinze anos, atingindo cerca de 50%, a maior fração de tal aumento, 12%, foi devida à reexportação de importações e não a uma maior produção real de valor, que correspondeu apenas a 8% (Expresso, 9/6/2023);

- segundo outro economista, José Reis, até 2019, foram criados 520 mil postos de trabalho, dos quais 314 mil, 60,3%, nos ramos de baixa produtividade, de que se destaca o setor de alojamento e restauração, fortemente dependente do turismo, que representa 23% do emprego, mas onde o salário médio, em boa parte dependente de mão-de-obra migrante sobreexplorada, corresponde apenas a 69% do salário médio nacional (DN, 5/06/2023);

- segundo um estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos, na agricultura, apesar da construção da barragem de Assuão portuguesa, a barragem do Alqueva, por obra e graça dos governos de maioria absoluta do Professor Cavaco com financiamento europeu para benefício do agro-negócio e da grande propriedade fundiária de capital estrangeiro,  o valor acrescentado ascendia a 8183,4 mil milhões de euros, em 1980, contra apenas  3 500 milhões de euros, em 2021, ou seja, menos de metade, com a agravante de ter origem numa especialização em culturas de alto rendimento, relativamente supérfluas e ecologicamente insustentáveis para satisfazer as necessidades da Europa do euro, em que estamos integrados, enquanto importamos cada vez mais cereais e outros bens agrícolas mais indispensáveis;

- entre 2000 e 2022, Portugal viu o seu PIB por habitante em paridades de poder de compra (PPS) divergir da média UE, já que este passou de 85,3% para 77,2%. Em contraste, só para citar alguns exemplos, a Bulgária passou de 28,8% para 58,8%, a Croácia de 50,0% para 71,5%, a Letónia de 36,4% para 74,1%, a Lituânia de 38,4% para 90,05% e a República Checa de 73,36% para 90,9%.

Em suma, os que defendem que se não nos tivéssemos integrado na zona euro estaríamos pior esqueceram-se seguramente de dizer o que seria pior. Tem razão o economista João Ferreira do Amaral, um dos poucos que previu o desastre em curso da integração do país na zona euro quando a legião dos seus apologistas, partidários de uma «Europa alemã», a sua principal beneficiária, se não mesmo a única, cantavam hossanas ao progresso eterno que diziam avizinhar-se: «Fui adepto de adesão à então CEE. Mas se fosse o que se tornou após Maastricht, não seria a favor» (Expresso, 2/06/23). Tudo indica que a história recente lhe deu razão.

Joaquim Jorge Veiguinha