Artigo:Setembro 2022, o mês de todos os perigos

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Setembro 2022, o mês de todos os perigos

Max Adler (1873-1937), socialista austríaco, defendia que a liberal-democracia, baseada no princípio do governo da maioria não era incompatível com os regimes autoritários de direita e extrema-direita tanto os de tipo bonapartista como os abertamente fascistas e fascizantes.

A História deu-lhe razão. Em novembro de 1932, o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (NSDAP) venceu as eleições alemãs com maioria relativa (33,9% dos sufrágios), sendo Hitler nomeado primeiro-ministro pelo Presidente da República, o marechal Hindenburg. Após o incêndio do Reichstag (27 de fevereiro de 1933), o primeiro passou a governar por decreto, ilegalizando os partidos da oposição e concentrando todos os poderes em suas mãos.

Mais recentemente, Viktor Orbán, primeiro-ministro húngaro, aboliu a separação de poderes, particularmente a independência do judiciário e do Tribunal Constitucional, instaurou o controlo político do Parlamento, onde o seu partido, o Fidez, é maioritário, e suprimiu a independência dos órgãos de comunicação social que não lhe são fiéis, em consequência de maiorias de dois terços conquistadas em eleições legislativas passadas, já que este ano conseguiu apenas 54% dos sufrágios. Na Polónia, o Partido Direito e Justiça (43,59% em 2019) aplicou as mesmas receitas de Orbán.

2022 é marcado pelo crescimento dos partidos de extrema-direita na União Europeia: para além do Fidez, destacam-se o SDS, Partido Democrático da Eslovénia, com 23,48% dos sufrágios, a Frente Nacional de Marine Le Pen (17,3%), terceiro maior partido nas legislativas gaulesas e cuja dirigente disputou a segunda volta  das presidenciais ganhas por Emmanuel Macron, não esquecendo o português Chega que, com 7,18% dos sufrágios, se tornou o terceiro maior partido político representado no Parlamento português. Em 11 de setembro, os eufemisticamente designados Democratas Suecos de Jimmie Akesson, um partido com raízes abertamente nazis, obteve 20,6% dos votos nas eleições legislativas suecas, o que lhe permite condicionar a constituição do futuro governo de direita do Partido Moderado de Ulf Kristerson, que ficou em terceiro lugar.

Mas o centro da ofensiva da extrema-direita é atualmente a Itália, país fundador da Comunidade Económica Europeia e a terceira potência económica e política da zona euro. No próximo sábado realizar-se-ão as eleições legislativas italianas. As mais recentes sondagens apontam para a vitória do partido neofascista Irmãos de Itália (FI) de Giorgia Meloni com 25,1 %. O Partido Democrático (Pd), representante da esquerda italiana, prevê-se que ficará em segundo lugar com 20,8%, mas com uma tendência para a quebra eleitoral, enquanto o partido de Meloni regista, pelo contrário, uma tendência de reforço e crescimento. Além disto, estima-se que a eufemisticamente designada coligação de “centro-direita” (FI, Liga, FI e outros partidos menores) consigam 46,6% dos sufrágios contra apenas 27,2% da coligação de centro-esquerda constituída pelo Pd, Esquerda Italiana (EI), Europa Verde e + Europa, dirigido pela senadora Emma Bonino.

Teremos que ter em conta ainda no resultado final, o atual sistema eleitoral italiano, o chamado Rosatellum, instituído pela lei Rosato, da autoria do deputado Ettore Rosato, em 26 de outubro de 2017, que combina o sistema maioritário a uma volta (37% dos votos, 147 para Câmara e 74 para o Senado) com o sistema proporcional (61%, 245 deputados e 122 senadores), cabendo os restantes 2% (8 deputados e quatro senadores) aos eleitores italianos no estrangeiro. Segundo este sistema eleitoral, votado favoravelmente pela Liga, FI e Pd, na altura dirigido por Matteo Renzi que, em 2018, formou um novo partido, o Itália Viva, o partido que obtiver mais de 43% dos votos conseguirá uma espécie de bónus eleitoral que lhe permitirá uma maioria absoluta folgada de dois terços (70%) e, assim, alterar a Constituição italiana como quiser e abolir ou condicionar fortemente direitos fundamentais, de que se destaca o direito à interrupção da gravidez, como já defendeu veladamente a provável primeira-ministra italiana. Apesar de existirem ainda 10% de indecisos e a taxa de abstenção prevista ser de 33,4%, a vitória de Meloni, atualmente a dirigente politicamente mais inteligente da extrema-direita europeia, contribuirá para o reforço dos partidos desta área política no velho continente e poderá ser um grande golpe no que resta da Europa social com a instituição na Itália de um imposto único sobre o rendimento, em vigor nos países da Europa de leste e na Rússia, e de outras medidas económicas neoliberais. Veremos se no próximo sábado o mês de setembro se tornará ou não na Europa o mês de todos os perigos.      

Joaquim Jorge Veiguinha