Revolução precisa-se
À primeira vista, um paradoxo: faltam professores em Lisboa, mas não nas Beiras; vagas para médicos na região de Lisboa e Vale do Tejo ficam por preencher; e mais recentemente, ficaram por ocupar significativa parte das vagas para o INEM. Durante muitos anos habituamo-nos a pensar que era no “interior” que havia falhas de docentes, de clínicos, de técnicos de saúde. Porquê, agora, Lisboa? Seguramente por uma razão: o preço da habitação em Lisboa (e mesmo nos “arredores”) é de tal forma exorbitante que mesmo estes grupos profissionais - que ganham claramente acima da média - não conseguem habitar na cidade. Lisboa vendeu-se ao turismo. A “taxa turística” é um maná para os cofres camarários, a presença permanente de turistas alimenta cafés, bares e restaurantes. Enchem-se facilmente os hotéis que nascem logo que um espaço significativamente amplo fica disponível, pululam alojamentos locais, legais ou ilegais, aliciam-se os estrangeiros suficientemente ricos com os vistos gold e “namoram-se” os nómadas digitais. Tudo isto se traduz na expulsão dos cidadãos nacionais da capital do país, onde nem mesmo a chamada “classe média” consegue suportar os custos da habitação.
A CML, ao longo dos últimos anos, tem tomado algumas medidas: comparticipação no pagamento de rendas, disponibilização de alguns fogos a preços controlados, alguma reabilitação de prédios abandonados. Mas é já óbvio que tais medidas são meros paliativos. Entregue ao livre jogo do “mercado”, os preços das casas, para compra ou para arrendamento, continuam a subir e atingem valores estratosféricos para os salários dos portugueses. A solução (ou pelo menos o atenuar) passa pela construção massiva de prédios destinados a serem postos no mercado a preços controlados que os trabalhadores portugueses possam pagar. Tal só é possível pela construção pública: do Estado ou da Câmara. É uma patetice admitir que o setor privado esteja disponível para o problema: o máximo lucro é o seu princípio “social”.
Se nada for feito – e rapidamente – Lisboa será uma cidade muito bonita, sem lisboetas, apenas para ser visitada por turistas bastante ricos. E habitada por imigrantes explorados, que se acumulam em cubículos com as consequências que ainda há dias vivemos com o incêndio na Mouraria. É isso que queremos?
António Avelãs