Artigo:Que lugar para a democracia?

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“Neste momento, no MEC, até sabem a sopa que os alunos comem… Não podemos decidir comprar um marcador, quanto mais decidir de currículos”. Palavras de denúncia de João Jaime, diretor da Escola Secundária Camões, e que, de forma muito concreta, testemunham do que é a realidade das escolas, do conceito de “autonomia” do ministério e do governo.

No debate promovido pela FENPROF, “Que lugar para a democracia?”, a revisão do Regime de Autonomia e Gestão das Escolas (DL 75/008), foi abordada de diferentes ângulos. Através de intervenções de fundo de Manuela Mendonça, da FENPROF e Licínio Lima, da Universidade do Minho. De um painel em que foram apresentadas experiências concretas vividas no dia-a-dia das escolas, e que contou com a participação de Francisco Melo Ferreira, Presidente do Conselho Geral da Escola Secundária Maria Amália Vaz de Carvalho; Eugénia Coelho, Diretora do Agrupamento de Escolas de Loures nº 1; e Anabela Simões. ex-Coordenadora do Departamento de Línguas do Agrupamento de Escolas de Celorico de Basto. E, naturalmente, da participação de muitos outros intervenientes presentes na iniciativa. O encerramento dos debates coube a Mário Nogueira, secretário-geral da FENPROF.

Que sistema educativo queremos?

“Não há saída da crise sem mais e melhor educação. A educação é o caminho”, defendeu Manuela Mendonça.

Numa breve intervenção, centrada nas preocupações e propostas da FENPROF, a coordenadora do SPN começou por sublinhar a importância crucial da democracia e das dinâmicas participativas. Em relação à autonomia das escolas (e não “autonomia do chefe”) referiu, nomeadamente, a necessidade de reforço das competências do Conselho Pedagógico e lembrou que a autonomia “é uma questão política”. Frisou ainda que não há quaisquer razões de ordem pedagógica para uma reestruturação da rede escolar com mais mega-agrupamentos.

O que está em causa é o “sistema educativo que queremos”, disse Manuela Mendonça, salientando que "sendo a democracia a dimensão que deve dar consistência às estruturas organizacionais da escola, a FENPROF considera essencial aprofundar práticas participativas que reforcem a democraticidade na organização escolar".

Uma lógica dos conselhos de administração das empresas

"Os mega-agrupamentos são os braços do poder centralizado", afirmou Licínio Lima, numa intervenção em que sublinhou a importância do processo de mega-agrupamentos em curso.

O que está neste momento em causa é um gerencialismo que “não tem nada a ver com autonomia democrática”. Antes se inscreve numa lógica idêntica à dos conselhos de administração das empresas - um líder unipessoal (rosto da escola), em nome da eficácia, eficiência.

A concentração de poderes no diretor é assim uma questão central. Porque se insere numa re-hierarquização, com superiores e subordinados. Uma verticalização do organigrama da escola, em que o MEC está no cume desse organigrama.

Neste quadro o diretor surge como mero executante das medidas da política educativa. Ou seja: como um executivo, um gestor subordinado.

Perante esta reconcentração do poder central, cada vez mais longe de uma perspetiva socio-comunitária, Licínio Lima defendeu que são indispensáveis outras lógicas, pensar sobre como caminhar para uma administração escolar centralizada. É preciso “descer à terra”, dar “mais voz à irracionalidade de gestão de recursos”, considerou. E defendeu a necessidade de “ter aliados locais”, o que nomeadamente passaria por uma aproximação entre sindicatos e movimentos sociais.