Artigo:Qatar? O exemplo dos jogadores de futebol

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Qatar? O exemplo dos jogadores de futebol

Sem querer branquear ou de alguma forma desculpabilizar o Estado Qatari, muito muito muito longe disso, parece-me bem que, em termos de Direitos Humanos, o Qatar é todo o Mundo.

Hoje, enquanto todo o Mundo dito “civilizado” espera, suspenso e expectante, pelas declarações de Marcelo acerca do resultado do jogo Portugal – Gana, digo, acerca dos Direitos Humanos, no próprio olho do furacão mediático do momento, por cá, na Cuba e arredores, a PJ deteve 35 pessoas, suspeitas “… de tráfico humano de centenas de trabalhadores imigrantes para trabalhos forçados …“, segundo a SIC Notícias.

“Os suspeitos, (…), de nacionalidade estrangeira e portuguesa, encontram-se fortemente indiciados pela prática de crimes de associação criminosa, de tráfico de pessoas, de branqueamento de capitais, de falsificação de documentos, entre outros”, adianta em comunicado a PJ.

Esta semana, a Antena 1 passou uma reportagem acerca da ONG - AJUDA EM AÇÃO , com o projecto “ Bora Jovem”, em que um dos principais enfoques da peça foi a colocação em contexto de trabalho, no El Corte Inglês, de um jovem da etnia cigana.

A um quarto de volta ao equador de distância do Qatar, isto, no rosto com que a Europa fita, ainda é notícia digna de registo.

De facto a Humanidade é extraordinária.

Estávamos nós por aqui postos em sossego, e para nós a Humanidade é o Ocidente, aparentemente sem sobressaltos Humanitários, esquecendo em nome de interesses maiores, como por exemplo o Futebol, o que se passa pelo Mundo em termos de Direitos Humanos e Laborais, ignorando os relatórios da OIT e da Amnistia Internacional, a Síria, a Palestina, o Sahara Ocidental, o Iémen, enfim, centrados como sempre nos nossos problemas como a inflação, os juros, o crescimento do PIB e da economia e, de repente, vindo do nada, numa altura destas já em vésperas do Natal, cai-nos o Qatar em cima.

Nós, aqui no Ocidente, não estávamos à espera. O Qatar?

Ficámos surpreendidos porque, extraordinariamente, tínhamos esquecido que o Qatar tinha sido “escolhido” por Platini, Blatter e Sarkozy, com o beneplácito dos outros senhores do Futebol, há já uns longínquos 12 anos.

Ficámos surpreendidos porque os doze anos passaram mesmo e agora são os jogadores de futebol que, ao ajoelharem, ao não cantar o hino, ao tapar a boca ou usando as braçadeiras multicolor do “amor”, estão na linha da frente da contestação ao regime Qatari e, muito mais além, aos atentados aos Direitos Humanos que um pouco por todo o Mundo acontecem em permanência e sem hiatos temporais.

Enquanto dirigentes desportivos deslumbrados e complacentes, governantes subservientes e políticos situacionistas se vergam em mesuras ridículas nos principescos camarotes Emirados, no relvado, jovens desportistas de qualidade superlativa, ainda que principescamente pagos, exteriorizam, alguns com risco de vida, o seu descontentamento relativamente aos preceitos e preconceitos vigentes no país organizador do campeonato e, no caso dos Iranianos, no país que representam.

Como sempre considerei, os jogadores de futebol de topo são indivíduos inteligentes, sensíveis e extremamente conhecedores da realidade em que cresceram, tendo por isso uma consciência muito significativa dos contextos humanos em que estão inseridos.

A prova da sua integridade humana revela-se em campo, dizendo presente quando chegou a sua vez de intervir, jogando e contestando.

Um outro exemplo digno de registo aconteceu em 1978 quando Johan Cruyff, à época já um dos melhores futebolistas do mundo, por razões político-humanitárias decidiu não participar no Mundial da Argentina de Videla. Dirigentes, Governantes e Presidentes dos países em disputa, estiveram lá praticamente todos.

Que o exemplo dos jogadores de futebol, aparecendo quando chegou a sua vez, mesmo com a ausência como Cruyff, possa servir como exemplo para os titubeantes professores nas lutas que se avizinham.

Ricardo Furtado