Artigo:Professores fartos e cansados

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Professores fartos e cansados

Nem mais um dia. Se puder ser antes, melhor. É a atitude dos professores à beira da aposentação. São uma geração que lutou e lutou e lutou, arrostando a incompreensão e o repúdio da sociedade e a má-fé dos governos, pela melhoria das condições do exercício da profissão. Hoje, vê-se vencida — desautorizada, proletarizada e enredada numa entorpecente burocracia kafkiana. E prevê-se que daqui para a frente piore a detracção e o aviltamento. Os novos “professores” que o ministro da Educação pretende recrutar ad hoc virão impreparados e acríticos, sem história nem memória, dispostos a aceitar tudo, muito agradecidos por serem imerecidamente promovidos a funções de que não sabem a dimensão da responsabilidade e exigência.

Perante a há muito anunciada falta de professores, o que faz este governo? Procede à elementar justiça da contagem do tempo de serviço? Elimina as cotas de acesso aos 5º e 7º escalões? Atribui mais tempos lectivos à função de director de turma? Melhora os salários? Faz qualquer coisita que dignifique o dia-a-dia dos professores? Nada.

Uma classe política possidónia, dada ao improviso da declaração de habilitações literárias, é apenas capaz de ressentimento e desdém pela instituição escolar e pelos professores. É neste quadro de menosprezo ao mais alto nível pela escola, pela erudição e respectivas certificações que se torna aceitável para este ministro da Educação que a disciplina de Português possa ser leccionada por professores de Inglês, Francês, Alemão ou Espanhol; Geografia possa ser dada por professores de História; a frequência de qualquer acção de formação em informática possa ser suficiente para dar aulas de Tecnologias da Informação e Comunicação; e se passe a contratar qualquer bicho-careta desocupado que tenha alguma habilitação superior. É claro que este expediente servirá para resolver a futura escassez de professores em todas as disciplinas.

Só este ano aposentar-se-ão mais de 2220 professores. Outros seguirão a um ritmo de 185 por mês. Talvez a população os substitua. A população que a ministra ganhou quando perdeu os professores, entre 2005 e 2009. Parece ser esse o plano de mais este ministro do PS, para perfazer os 34 mil necessários até 2030. Depois, logo se verá.

Desde 2005, o PS tem um problema insanável com os professores. Em Maio de 2019, houve oportunidade de reconciliação, mas Costa, escorado na pusilanimidade da direita e na obtusidade seguidista da comunicação social, preferia demitir-se a contar os anos de serviço que os professores cumpriram durante o congelamento da carreira.

O contínuo desrespeito, desvalorização e agravamento das condições de trabalho desiludem vocações e impedem a natural renovação da classe.

Agora, para os jovens, professor é profissão de velho e não tem interesse. Eles bem sabem o que fazem os professores passar. Falta “atractividade”, que é o mesmo que dizer prestígio, carreira aliciante, salário digno. As escolas superiores de educação estão às moscas há anos. Quase ninguém quer ser professor. Os poucos que querem, melhor seria que não quisessem, pois são os piores alunos, candidatam-se com médias miseráveis e, pior que tudo, vêm imbuídos da vulgata deturpada, preguiçosa, da profissão.

Francisco Martins da Silva