Artigo:Professora aluga sofá a 10 euros por dia para poder dar aulas

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Professora aluga sofá a 10 euros por dia para poder dar aulas

Foi este título de capa do Expresso deste fim de semana que me levou a passar de imediato à notícia na página 16 do semanário. Um título de tal forma bombástico tinha de ter um mínimo de sustentação, independentemente de, desde o início deste ano, os sindicatos de professores alertarem para o facto de inúmeros horários continuarem por preencher por causa dos preços das habitações, incomportáveis para os professores colocados longe de casa.

A notícia é desenvolvida em duas páginas do jornal e os títulos e os números são bem a imagem duma classe desvalorizada e de uma escola pública desprezada. “O sofá alugado, a vida num quarto e o despejo à vista”/ “Num anúncio pedia-se €350 por uma cama, mesa de cabeceira, num quarto sem janela nem acesso à cozinha.”/ “Sem aulas a várias cadeiras todo o 1º período” / “Há turmas sem professor de História e que no ano passado já não tinham tido aulas durante dois períodos” são alguns dos títulos que certamente não deixarão de surpreender quem se limitar a passar os olhos pelas “gordas” e não quiser conhecer histórias reais mais próximas de um filme neo-realista.

Para além duma reportagem em que alguns candidatos e algumas candidatas dão o seu testemunho, aflige ver o peso que a especulação, o turismo, a ausência de alojamentos para professores deslocados, o desinvestimento na classe e no seu rejuvenescimento está a ter na degradação da escola pública. É a lei do desenrasca: grupos criados no facebook para ajudar a encontrar casa, para conseguir partilhar boleias, para partilhar casa, porque sem uma apertada ginástica financeira, do que se recebe no fim do mês por um horário incompleto mal dá para as deslocações, alimentação e despesas mínimas. E caso não se consiga encontrar ninguém para preencher o horário resultante duma baixa por um professor do quadro doente ou exausto, a lei do desenrasca continua: a direcção do agrupamento distribui as horas por outros colegas que acrescentarão horas extraordinárias ao seu horário já insuportável.

Com carências mais acentuadas na região de Lisboa, Algarve e Setúbal e com incidência em grupos onde faltam docentes – Informática e Geografia – este panorama vai-se aprofundar e alargar a outros grupos de docência. A terminar o 1º período, existem 121 horários em fase de oferta das escolas que, a serem preenchidos, não dão quaisquer garantias de o serem por candidatos com formação para a docência.

Hoje a situação é esta. O governo faz a política da avestruz. Nem sequer os títulos bombásticos dos jornais ou as denúncias e acções dos sindicatos e das suas associações lhes causam mossa. Quando pressionados, os responsáveis do ministério da educação remetem-se ao silêncio ou então, limitam-se a fugidias respostas vagas e inconsequentes. Mas o caso é grave e com a evolução de que até 2030, segundo o relatório do Conselho Nacional da Educação, 58% dos professores do quadro se aposentarão, as consequências serão desastrosas.

Almerinda Bento