Pacote laboral: ataque aos direitos da parentalidade
Cátia Domingues | Vice-Presidente SPGL
O recente pacote laboral apresentado pelo Governo representa um dos mais sérios retrocessos nos direitos de parentalidade desde a sua consagração na legislação portuguesa.
Sob o argumento da “flexibilização” e da necessidade de “ajustar a lei às dinâmicas do mercado de trabalho”, o que se verifica, na prática, é uma ofensiva clara contra um conjunto de direitos que foram construídos ao longo de décadas, fruto da luta das trabalhadoras e dos trabalhadores, das suas organizações sindicais e de uma visão progressista sobre a conciliação entre vida profissional e familiar.
Entre as alterações mais gravosas destaca-se a possibilidade de alargamento dos horários e da adaptabilidade, mesmo para trabalhadoras/es com filhos menores, reduzindo a previsibilidade e dificultando rotinas essenciais ao bem-estar das crianças. A par disso, surgem limitações subtis, mas significativas, ao gozo dos direitos de dispensa para assistência a filhos, nomeadamente através de procedimentos mais burocráticos e da possibilidade de pressão sobre os trabalhadores para ajustarem estas dispensas às “necessidades de serviço”.
Acresce ainda o perigo de se reforçar uma cultura laboral que penaliza, de forma direta ou indireta, quem exerce plenamente os seus direitos parentais. A ausência de mecanismos eficazes de fiscalização e a fragilização dos tempos de cuidado representam uma ameaça sobretudo para as mulheres trabalhadoras, que continuam a assumir, maioritariamente, estas responsabilidades.
Num país onde a natalidade é sistematicamente apontada como desafio estratégico, é contraditório que se proponham medidas que dificultam precisamente a vivência da parentalidade. O que se exige é o reforço, e não a erosão, dos direitos que garantem igualdade, proteção e condições dignas para quem cuida.
O SPGL reafirma a sua oposição a qualquer tentativa de regressão laboral e continuará a lutar, ao lado das e dos docentes e demais trabalhadoras/es, pela defesa de direitos que são pilares de uma sociedade justa, inclusiva e orientada para o futuro.
Texto original publicado no Escola/Informação Digital n.º 47 | novembro/dezembro 2025