Artigo:O vergonhoso sistema de avaliação dos docentes do ensino superior público

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O vergonhoso sistema de avaliação dos docentes do ensino superior público

Tiago Dias
| Dirigente sindical |

Hoje em dia já não se pode esconder que a introdução da avaliação do desempenho no âmbito do emprego público, e a sua relação direta com a alteração da posição remuneratória, nada teve a ver com o reconhecimento do mérito. Pelo contrário, ficou evidente que apenas se tratou da criação de um espartilho legal para não permitir a normal progressão salarial dos funcionários públicos, em total desrespeito pelas legítimas expetativas de desenvolvimento regular das categorias profissionais. E, no caso dos docentes do ensino superior público, este bloqueio às progressões salariais assume contornos ainda mais vergonhosos.

Os Estatutos das duas carreiras - universitário (ECDU – artigo 74.º-C) e politécnico (ECPDESP – artigo 35.º-C) - preveem o modo como se procede à alteração do posicionamento remuneratório desses Professores que, tendo em conta a equiparação legal entre os dois subsistemas, também em matéria de alteração do posicionamento remuneratório adotam a mesma solução para ambas as carreiras, e que, de forma resumida, apresenta o seguinte quadro legal:

  • Cada instituição de ensino superior, através de regulamento próprio e em função da avaliação do desempenho, estabelece o modo como se procede a esta alteração.
  • Os membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças, da Administração Pública e do ensino superior, através de despacho conjunto, fixam, anualmente, o montante máximo dos encargos financeiros que, em cada ano, cada instituição poderá afetar à alteração do posicionamento remuneratório. Este montante é indicado em percentagem da massa salarial total do pessoal docente da instituição.

Consequentemente, o orçamento anual de cada instituição de ensino superior deve contemplar dotações previsionais adequadas às eventuais alterações do posicionamento remuneratório dos docentes, tendo em conta o despacho conjunto e as suas disponibilidades orçamentais. Acresce ainda que o regulamento de alteração de posição remuneratória de cada instituição deve prever a obrigatoriedade de alteração do posicionamento sempre que um docente, no processo de avaliação do desempenho, tenha obtido a menção máxima durante um período de seis anos consecutivos.

De uma forma geral, as instituições de ensino superior estabeleceram como menção qualitativa máxima o excelente, a que correspondem 3 pontos. Assim, existe obrigatoriedade de alteração do posicionamento remuneratório sempre que um docente acumule 18 pontos no âmbito da avaliação do desempenho em seis anos consecutivos. Nas outras situações, em que não exista um período de seis anos consecutivos com a menção máxima, cada regulamento estabelece um número mínimo de pontos que permite a alteração de posicionamento remuneratório. Contudo, até hoje, a quase totalidade das instituições não fez alterações do posicionamento remuneratório por esta via com o fundamento de não existir o despacho conjunto que fixa o montante máximo dos encargos financeiros que podem ser utilizados para essa finalidade.

Entre alterações obrigatórias e as outras reina a grande balburdia no que respeita às progressões salariais. Mas a verdade é que existe uma imensa maioria de docentes que, apesar de não terem alcançado a menção máxima na avaliação do desempenho durante um período de seis anos consecutivos, possuem hoje mais de 20 pontos acumulados. Em quase todos os regulamentos existentes, este número de pontos permitiria, pelo menos, duas alterações de posição remuneratória. Contudo, com fundamento na falta do referido despacho conjunto, as instituições recusam alterar o posicionamento remuneratório dos doentes que já reúnem pontos para esse efeito.

Enquanto não se abandona este sistema anacrónico de progressão nas categorias é urgente colocá-lo a funcionar. Para isso torna-se indispensável que o Governo e as instituições cumpram a Lei.

As instituições têm de apurar os valores adequados para as alterações do posicionamento remuneratório que não apresentem carácter obrigatório. No caso de esses valores ultrapassarem a massa salarial total do pessoal docente contemplada no último orçamento da instituição, deve ser solicitada a emissão do despacho conjunto acima referido, a fixar o montante máximo dos encargos financeiros a afetar a essas alterações.

Ao Governo exige-se que não fique a aguardar o pedido das instituições de ensino superior e emita o referido despacho conjunto fixando de forma genérica e abstrata o montante em causa, permitindo deste modo que seja cumprida a Lei e que os docentes sejam colocados nas posições remuneratórias a que têm direito.

Por sua vez, o SPGL vai continuar a desenvolver os meios que se encontram ao seu dispor para forçar o Governo e as instituições a cumprirem a Lei.   Esta será, portanto, uma das matérias a tratar com o Ministro da Educação, Ciência e Inovação (MECI), Fernando Alexandre, na reunião agendada para o próximo dia 18 de junho. Outras medidas serão anunciadas brevemente.

Texto original publicado no Escola/Informação n.º 308 |maio/junho 2024