O valor do Voto e os Votos perdidos
Apesar de tudo e, sobretudo, apesar dos resultados que decorreram das últimas eleições, um dado revelador que não pode deixar de ser considerado e, até, enaltecido, é a superior participação dos portugueses no acto eleitoral.
Ainda demasiado elevada numa democracia plena e participada, a abstenção de dia 30 de Janeiro revelou uma maior preocupação dos eleitores Portugueses pelo futuro do país.
As razões para este menor abstencionismo serão com certeza múltiplas e diversificadas, as motivações à direita e à esquerda serão substancialmente diferentes mas, penso, o facto de estar em causa uma eventual mudança muito significativa das orientações ético-politicas que decorreram da Revolução de Abril, dito agora desta forma, soou como um toque a rebate no sentido de passarmos, enquanto interessados, a dedicar mais tempo e atenção às questões da governabilidade do nosso país.
Curiosamente, neste sentido, houve até uma tomada de consciência generalizada pelo facto de muitos dos nossos votos não surtirem qualquer efeito prático na eleição de deputados. Perante a inesperada e volumosa realidade, foram mais de 700 000 votos, alguns dos partidos mais prejudicados, que não PS e PSD, sugeriram até alterações à lei eleitoral de forma a que esses votos “perdidos” possam contar, de facto, em futuras eleições.
Hoje, não refeitos ainda da brutal constatação anterior, é que os votos que para nada contaram dariam para eleger perto de 20 deputados, deparamo-nos com a também brutal e inexplicável, digo eu, constatação de que 81% dos votos dos emigrantes não foram contabilizados.
Nos primeiros o método de Hondt e os círculos distritais, nos segundos a cópia do Cartão de Cidadão em falta, enfim aspectos que nada valorizam a meritória e inestimável vontade dos cidadãos em participar no que se convencionou chamar como “dever de cidadania” e que na prática se consubstancia como o único acto cívico relevante e significativo da grande maioria de nós no que diz respeito à vida em comunidade.
Neste sentido, e se queremos verdadeiramente que os Portugueses se envolvam de forma criteriosa e continuada nos destinos de Portugal, desde logo participando nos actos eleitorais, urge alterar tudo o que de alguma forma inutilize o sentido e o valor da sua vontade expressa em voto.
De facto ninguém compreenderia que, num ano em que a nova maioria quase suplanta a abstenção, a lei que enquadra os actos eleitorais persistisse em não considerar uma fatia muito significativa do eleitorado.
Ricardo GV Furtado