Artigo:O meu livro quer outro livro - “Não se pode morar nos olhos de um gato” de Ana Margarida de Carvalho

Pastas / SPGL / Dep. Aposentados

Em 15 de fevereiro de 2018, o Departamento de Professores e Educadores Aposentados do SPGL levou a cabo mais uma sessão de “O meu Livro quer outro Livro”. A escritora convidada foi Ana Margarida de Carvalho, que falou da sua obra, especialmente do livro “Não se pode morar nos olhos de um gato”.

A sessão teve início com o agradecimento pela presença da autora, por parte de António Avelãs, em representação do Presidente da Direção do SPGL, dada a impossibilidade de este estar presente.

A colega Dolores Parreira leu o ”Poema do Desamor” de Alexandre O’Neill que serve de mote ao livro de Ana Margarida de Carvalho “Não se pode morar nos olhos de um gato.

A autora explicou que escolheu este título surrealista porque o seu texto é quase como um sonho e cada leitor tem a sua interpretação. Além disso, todos os verbos do poema, mais ou menos agressivos, são usados ao longo do seu livro.

As personagens, do séc. XIX, náufragos que vão ter a uma praia, são encurraladas entre a falésia e o mar. Quando a maré sobe, ficam “pele com pele, encostados até ficarem com a mesma pele, o mesmo cheiro”. “Vão despindo as várias peles sociais que tinham ao longo da vida, até ficarem na sua nudez simbólica”.

“A areia da praia são sedimentos, restos a que se acrescenta o que a pele dos náufragos foi deixando”.

“A forma como olhamos o outro, olhando o exterior mas passado por dentro, e a forma como lidamos com os nossos preconceitos” estão ali representadas.

“As cobras deixam a pele pelo caminho; os humanos podem voltar a vestir a mesma pele, passados os acontecimentos.”

A autora falou ainda do seu primeiro livro “Que importa a Fúria do Mar”. Disse que as coisas horríveis descritas aconteceram mesmo. Perante a pergunta sobre o silêncio que existe à volta dos acontecimentos do Tarrafal, Ana Margarida Carvalho considerou que os professores têm a sua quota-parte na responsabilidade de fazer vir a público estas histórias.

Ainda respondendo a perguntas do público, a autora referiu que Nossa Senhora de todas as Angústias é uma santa “quase politeísta porque é uma santa de todas as preocupações. É uma narradora barroca na 1ª pessoa. Tem um pensamento circular”. “Há tantos anos a assistir às atrocidades já não quer saber se os outros se salvam ou não”.

Explicando a escolha do título, a autora disse ainda que um gato é um animal que “se desinteressa se não lhe prendem a atenção; o mesmo se passa com os humanos”.

O diálogo entre o público e a autora decorreu ainda acerca da dificuldade de tratamento de temas que tenham a ver com o regresso catártico a África, embora contemos já com obras como as de Lídia Jorge ou António Lobo Antunes.

Foi explicada a imagem da capa que representa um baixo-relevo de um obelisco em Oslo, Noruega. Essa imagem representa personagens que são destroços humanos que vão dar a uma praia.

A autora esclareceu ainda que o uso frequente de intertextualidades é uma homenagem à cultura portuguesa.

Como no início da sessão não foi possível fazer-se a “troca de livros”, no final Artur Baptista falou de “Que importa a Fúria do Mar” e leu um parágrafo (p. 137) que considerou emblemático, livro que deixou para troca.

Sílvia Baptista considerou que o escasso tratamento do tema da obra citada se deve a uma pedra que existe em cima das nossas consciências e congratulou-se por haver escritores que fazem essa denúncia.

Mais pormenores acerca do tema desta sessão poderão encontrar na “folha de sala” distribuída no momento e publicada no site.

Imagens da iniciativa