Artigo:Liz Truss e a impossibilidade da democracia

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Liz Truss e a impossibilidade da democracia

Ficou provado, se preciso fosse, que a crença ultraliberal na panaceia da descida dos impostos, como solução para todos os males da economia dos países, a la Iniciativa, é apenas isso, uma fé, ou melhor nem é apenas isso, é também a constatação de uma impossibilidade em democracia.

Os valores de uma democracia plena, e acrescento plena, para que não nos fiquemos apenas pela redução minimalista da democracia ao voto, como vai sendo prática em muitos países, não são compatíveis com sistemas económicos desequilibrados, assentes em sistemas fiscais pretensamente igualitários, a volta que lhe dão, e suportados na fantasiosa ideia de que mais dinheiro na mão dos ricos significa mais dinheiro investido na economia e, por maioria de razão, um maior crescimento económico de que toda a sociedade beneficiaria.

Isto não é verdade em democracia.

As funções sociais do estado,em  democracia, têm que ser inevitavelmente financiadas/suportadas por uma contribuição fiscal/impostos direta e indireta, justa, equilibrada e, não há volta a dar, de carácter proporcionalmente progressivo em função dos rendimentos.

Negar isto é recuar décadas ou mesmo séculos de tímidos e morosos avanços em termos de justiça social.

Como os “mercados” rapidamente evidenciaram, suportar as funções sociais do estado com dívida pública, deixando o dinheiro nas mãos dos mais ricos,  é um delírio ideológico deturpado de uma rapaziada que entende que o Liberalismo é, basicamente, isso.

A alternativa à contracção de dívida pública para garantir o funcionamento do estado social seria, suponho, acabar com o estado social. Propósito que, na verdade, não está muito longe do ideal que preconizam.

Estes liberais esganiçados e fantasiosos apoderaram-se do Liberalismo de uma forma muito redutora. Na verdade, volto a supor, envergonham os Liberais.

No meio disto tudo não deixa de ser curioso que Richi Sunak , o actual, tenha sido o único dos candidatos, pós Johnson, que nunca defendeu a descida generalizada de impostos. Alguma reserva, ainda que muito ténue,  de juízo, ainda assim.

Uma última nota  para dar conta que, numa altura em que “um em cada 5 funcionários públicos está a usar bancos alimentares e 35% saltaram refeições porque não tem comida” como disse Mark Serwotka, secretário-geral do sindicato dos serviços públicos e comerciais ingleses, ao The Guardian, a liberalinha Liz Truss se prepare, caso não o recuse explicitamente, para passar a receber 115000 libras anuais e de forma vitalícia, como paga pelos seus 49 dias na chefia do governo.

Para não pesar aos ricos amigos que tem, quererá por certo que a Inglaterra se endivide para lhe garantir o pecúlio.

Liberal, disse ela.

Ricardo Furtado