Lei das compensações
O salário mínimo mensal constitui uma percentagem crescente do salário médio mensal. Segundo dados coligidos pelo economista Eugénio Rosa, em 2015, aquele representava 53,1% do segundo, enquanto, em 2021, já representava 64,6 %. Com o aumento previsto do primeiro para 705 euros, em 2022, passará a representar 67,3% da remuneração média mensal, o que leva este economista a concluir que Portugal se está a transformar cada vez mais num país de salários mínimos (Fonte: ‘i’, 9. 11. 21). Se não for invertida, uma situação deste tipo terá implicações sobre as aposentações futuras, pois a base salarial é muito baixa, o que terá como consequência, tendo em conta a degradação das taxas de substituição, pensões cada vez mais baixas no futuro. A condição necessária para tal inversão, é um modelo económico alternativo baseado na qualificação, no conhecimento e na inovação e não no turismo de massa, como o atual. Mas isto não passa, nos tempos que correm, de uma miragem.
Tendo em conta estes pressupostos, não deixa de ser surpreendente que o Governo demissionário perante a pressão dos representantes das entidades patronais, que reivindicam uma compensação pelos custos acrescidos que um salário mínimo de 705 euros acarretará sobre as empresas mais frágeis e mais expostas à concorrência, encare a possibilidade de devolver 84,5% do encargo suplementar da TSU resultante do aumento do salário mínimo de 665 euros para 705 euros. A medida, no entanto, tem precedentes, pois já foi aplicada quando este aumentou de 635 para 675 euros, em 2021. Neste caso, o incremento da TSU foi de 99,8 euros por trabalhador, o que representa uma devolução às entidades patronais de 84,5 euros. No caso do salário mínimo de 705 euros, o aumento daquela taxa será de 133 euros, o que equivalerá a uma devolução às entidades patronais, que deverão requerê-la junto do IAPMEI e do Turismo de Portugal, de cerca de 112,40 euros. O custo global suportado pelo Estado com esta devolução passará de 62,2 milhões de euros, em 2021, para 99,8 milhões, em 2022 (Fonte: DN, 17. 11. 2021).
Apesar do Executivo rejeitar a redução direta da TSU, defendida pelo representante da Confederação de Comércio e Serviços de Portugal (CCP), uma medida deste tipo contribuirá para sobrecarregar indiretamente a Segurança Social, já que haverá uma quebra de receita correspondente à devolução às entidades patronais do aumento da TSU proveniente da atualização do salário mínimo. O que torna esta medida ainda mais surpreendente são as previsões sobre o valor das pensões futuras em percentagem do salário médio. Segundo cálculos da Comissão Europeia em 2018, por volta de 2040 os aposentados portugueses receberão apenas uma pensão equivalente a 54,5% do salário médio, valor que descerá, segundo estimativas mais recentes da mesma instituição, para menos de metade deste. Na perspetiva de uma degradação salarial que não tem cessado de aumentar na última década e que se manterá se o modelo económico não for alterado, o que é altamente improvável numa eurozona em que os países mais débeis estão votados a um défice tecnológico crescente relativamente aos países mais desenvolvidos em consequência de uma moeda comum sobrevalorizada que financia os países do norte e centro da Europa à custa dos primeiros, o futuro dos aposentados portugueses será cada vez mais negro. E as medidas que preconizam a devolução do aumento da TSU às entidades patronais em consequência da atualização do salário mínimo são um mau presságio para inverter esta tendência e também um péssimo indicador para a melhoria da sustentabilidade de uma Segurança Social cada vez mais debilitada.
Joaquim Jorge Veiguinha