Artigo:Iémen - Quando morrer de fome não é notícia

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Iémen - Quando morrer de fome não é notícia 

Século XXI, Iémen: num único hospital pediátrico morrem 12 crianças de fome por mês, 47 000 pessoas vivem com níveis "catastróficos" de insegurança alimentar - ou condições semelhantes à fome -, 16 milhões vivem em condições de segurança alimentar de "crise" ou "emergência". 

A UNICEF recolhe donativos, aqui

Onde está o grande destaque noticioso, diário, retumbante, necessário? 

Aqui, na CNN, a lembrança. 

Tal como na Síria, a banalidade do mal, consentida, geostratégica, lastro de um passado carregado de ódio e ganância, numa mistura mortal entre capitalismo selvagem, fanatismo religioso e indiferença da comunidade internacional. 

As vítimas: pessoas comuns, que apenas desejam aquilo que para muitos têm sido favas contadas, como água potável, alimentação, um teto, um sítio onde não se morra em fogo cruzado ou bombardeamentos, onde os cuidados médicos básicos sejam garantidos e não apenas uma miragem de um sítio bom para morrer, como tem acontecido às 12 crianças por mês que chegam tarde demais àquele hospital pediátrico, acabando por sucumbir à fome, apesar dos cuidados médicos, tão debilitados se encontram pela desnutrição.  Aliás, como acontecia com os presos libertados dos campos de concentração nazis, ainda vivos mas já mortos.  

Voltando ao início, por que razão problemas tão graves como este não são mais vezes notícia? A notícia que estimula e desperta a solidariedade?  

Será por a indústria mediática estar tão ocupada a intoxicar os espetadores com o lixo que eles supostamente desejam, eclipsando-se ética e deontologicamente, criando monstros como aquele multicéfalo que invadiu o capitólio a 6 de janeiro? 

Como diria um bom católico, os pensamentos, os atos e as omissões têm consequências, que não apenas os lucros das empresas e a “satisfação” dos espetadores: a degradação da democracia, a anestesia cívica, a ignorância, o crescimento do populismo e os seus riscos fascizantes, são consequência da irresponsabilidade de uma indústria mediática cada vez mais convertida à lógica brutal do capitalismo selvagem. 

A fome e as mortes evitáveis não são apenas as consequências da inação direta dos estados, ou dos perpetradores institucionais ou “terroristas” de cada país onde acontecem, são também resultado da inação de muitos atores da história, incluindo todos os que podiam ter dado a notícia que teria originado aquele dólar ou aquele euro capaz de fazer chegar uma criança ao hospital, antes de atingir o ponto em que nada mais há a fazer. 

João Correia