Artigo:Habitação: os dilemas de uma área socialmente fundamental

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Habitação: os dilemas de uma área socialmente fundamental

O Público de hoje, 12 de outubro de 2020, titula na 1ª página: “Mais de metade dos inquilinos deixou de pagar renda em Lisboa”, tema que desenvolve nas páginas 20 e 21, com a “assinatura” de Cristina Faria Moreira.

A leitura do artigo levanta um conjunto complexo de interrogações e de questões:

- Metade dos inquilinos a não pagarem as rendas, alegando a queda de rendimentos devido à pandemia, o que traduz, com brutalidade, o impacto que esta está a ter na economia, impacto muito mais difícil de suportar nas famílias mais pobres. Contudo, é de admitir que em alguns casos haja um aproveitamento oportunista da “moratória” legalmente decidida pelo governo, situação que pode explicar, em parte, os dados apresentados pelo Instituto de Habilitação e Reabilitação Urbana (IHRU): dos 2177 pedidos de empréstimo para pagamento das rendas “1075 não tinham sido aprovados porque os arrendatários não conseguiram fazer prova de quebra de rendimento ou entregaram documentação incompleta”. Segundo o estudo citado no texto, há senhorios que se queixam de que os inquilinos nada lhes disseram -deixaram pura e simplesmente de pagar a renda. Note-se que nem todos os senhorios são ricos: uma parte deles vive apenas das rendas que recebe. Como explicar que, estranhamente, o número de pedidos de empréstimo ao IHRU para pagamento das rendas tenha ficado muito longe do esperado?

Outro dado significativo do texto em análise é que os senhorios mostram pouco interesse e disponibilidade para apoiar as medidas de alcance social na habitação postas em prática pelo governo e por algumas câmaras municipais. Pouco interesse em alocar a habitação ao projeto da “renda acessível –“apenas 1% dos senhorios assinalaram ter interesse em colocar os seus imóveis nestes programas”, o mesmo sucedendo ao projeto “Renda Segura” da Câmara de Lisboa. Sinal claro: não podendo contar com a “classe” dos senhorios para concretizar o direito a habitação digna a um elevado número de cidadãos (sobretudo nas grandes metrópoles), o Estado e o poder local têm de lançar um vasto programa de construção que , por um lado, responda a esse direito constitucional e, por outro, provoque a baixa do valor das rendas, na sua maioria objetivamente especulativas. Essa, seria uma medida de esquerda!

António Avelãs