Artigo:Greve Geral - Depoimentos de Manuel Carvalho da Silva e João Proença

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Nota introdutória:

Foram pedidos textos aos secretários gerais da CGTP-IN e da UGT, sobre a greve geral, para a revista Escola Informação. O texto do secretário geral da UGT, João Proença, veio já com a revista encerrada. Por tal motivo não pode ser publicado.  Decidimos assim publicar aqui o texto pedido, acompanhado do texto de Manuel Carvalho da Silva.

A Direção


Uma Greve Geral pelos direitos e liberdades

“É uma Greve Geral que reclama um Portugal soberano e desenvolvido, e que afirma a necessidade imperiosa de os trabalhadores se baterem em defesa do emprego, dos seus salários, dos direitos laborais, dos serviços públicos e, decididamente, pelas liberdades e por valores fundamentais da democracia”, afirmou Carvalho da Silva, em conferência de imprensa de 19 de outubro, quando do anúncio da greve geral de 24 de novembro.

Desta esclarecedora intervenção do Secretário-geral da CGTP-IN, aqui reproduzimos largos extratos que, em linhas gerais, respondem à questão: porque é que este OE exige uma luta redobrada e firme dos trabalhadores.

Vivemos uma espécie de estado de ocupação do país

Portugal, ao executar o programa da Troika, está a ser governado num quadro que se assemelha a vivermos numa espécie de estado de ocupação do país. Nós corremos graves riscos quando temos um Governo que não interpreta os interesses dos portugueses e das portuguesas, mas sim os conteúdos do memorando da troika.

O Governo tem que ser o Governo do país, dos interesses e direitos dos portugueses e portuguesas, e não um Governo de defesa dos interesses dos credores e agiotas, que nos exploram com os compromissos que nos impuseram!

(…) Está em curso uma interpretação de fazer confundir o interesse nacional com os interesses expressos no memorando da troika. Os direitos dos portugueses e os parâmetros em que se organiza e relaciona a vida na sociedade portuguesa – desde logo a dimensão e amplitude dos nossos direitos como trabalhadores, e como cidadãos – situam-se no enquadramento jurídico do que é o Estado de direito português e nos parâmetros da Constituição da República. Não há interesse nacional que não tenha que ser submetido a estes parâmetros.

Nunca os trabalhadores e a sua luta foram obstáculo à economia, antes pelo contrário!

Não foi a luta dos trabalhadores que levou à destruição do aparelho produtivo português. Nós lutámos contra a destruição do aparelho produtivo e muitas vezes chamaram-nos retrógrados e outros nomes feios por assumirmos essas posições.

Não foi a luta do povo português e dos trabalhadores que levou aos descalabros das parcerias público-privadas que consumiram dezenas de milhares de milhões de euros, a favor de alguns oportunistas que assim enriqueceram.

Não foi, nem é, a luta dos trabalhadores que conduziu a que se tenham feito roubos (é disso que se trata) como o descalabro do BPN e outros resultantes de corrupção e compadrios, depois transferidos para o Orçamento de Estado, para o povo português pagar.

Não foi a luta dos trabalhadores portugueses que gerou e gera economia clandestina, informalidade, evasão e fraude fiscal, etc. Antes pelo contrário, como disse, estivemos e estaremos sempre do outro lado.

Pela renegociação da dívida

É preciso mobilizar a opinião pública, os portugueses, para que Portugal tenha uma voz forte junto da UE, exigindo a renegociação da dívida, com revisão dos prazos, de datas, da dimensão e da forma de resolver os problemas da dívida. Os trabalhadores vão fazer um sacrifício para defender tudo isto e para defender a democracia.

O momento é de extraordinária oportunidade. Todos sabemos, Portugal está a seguir, aceleradamente, as peugadas da Grécia no pior sentido e nós temos que travar esse desastre.

Não podemos assistir, sem agirmos, ao empobrecimento do país, à recessão e ao aumento do desemprego, às injustiças, ao empobrecimento acelerado.

AS RAZÕES IMEDIATAS DA GREVE:

As políticas assumidas pelo Governo em torno do Orçamento de Estado são de uma violência, duma dureza e de uma injustiça que não se aceita.

Os trabalhadores da Administração Pública, face às decisões tomadas para estes dois anos, perdem, em média, cerca de 30% da sua retribuição. Até há setores (alguns de níveis mais elevados) que perdem mais do que 30%. Observemos que a quebra dos salários dos trabalhadores gregos, de 2009 para cá, é de 35%. Nós estamos a aproximar-nos a grande velocidade, em curto espaço de tempo.

Em relação ao horário de trabalho é ignóbil a proposta que está apresentada pelo Governo. O aumento dos horários de trabalho (no contexto que vivemos) resulta inevitavelmente em mais desemprego, quer nas empresas que estão subocupadas, quer naquelas que estão em intenso trabalho, e significa uma perda salarial na ordem dos 7%. Além disso tem implicações graves em várias áreas, designadamente no direito de negociação coletiva. Do nosso ponto de vista, é claramente inconstitucional e tem entre outras implicações, por exemplo, a redução das contribuições para a segurança social, porque vai haver mais desemprego e os descontos para a segurança social dos trabalhadores que ficarão a trabalhar continuarão a ser os mesmos apesar do horário de trabalho ser maior.

Havia setores patronais que até já tinham colocado desafios para negociação com os sindicatos de, em certas situações, poder haver aumento de horários de trabalho, em função do tipo de trabalho que esses setores têm, avançando com propostas de compensação salarial. (…) Para um alargamento idêntico ao que é pretendido pelo Governo sugeriam uma compensação de aumento dos salários na ordem dos 10%, o que, por exemplo, provocava imediato aumento do Salário Mínimo Nacional.

Trata-se pois de uma operação de transferência direta, de uma parte dos rendimentos do trabalho para o capital, sem qualquer efeito no pagamento da dívida, ou na redução do défice do Estado.

Quanto à política de impostos, o Governo apenas prossegue um aumento sucessivo dos impostos sobre o trabalho. A riqueza lá continua apenas com umas promessazinhas (para encenação), de aqui ou ali dar mais uns tostões para parecer que também está a contribuir.

Toda a gente diz que o cancro dos cancros (perdoem-me a expressão, mas é uma formulação que às vezes se usa), do défice do Estado é o resultado desastroso das parcerias público-privadas. O Governo comprometeu-se a tratar esta matéria como prioritária, mas continua tudo na mesma. Preparam-se agora é para que as negociatas continuem acrescentando-lhe o negócio das privatizações.

O ataque a uma série de direitos dos trabalhadores, como os feriados, os dias de férias, e muitas outras matérias que mexem com valores de todo um povo tem de ser combatido. É a nossa cultura referências e compromissos civilizacionais que são postos em causa.

(…) Aquilo que está em curso no setor dos transportes é muito, muito grave. Nós apelamos aos portugueses para que tenham compreensão com a luta dos trabalhadores dos transportes, porque o que está em marcha vai significar uma enorme redução de oferta dos transportes à população, um desemprego muito grande e negociatas com privados para deitarem mão ao que é rentável no setor.

A outra observação é sobre o que o Governo designa de reformas da Administração Pública. Já tivemos oportunidade de dizer: o que está projetado, quer para a Administração Pública Central, quer para a Administração Local, provocará imenso desemprego direto (público) e a destruição de milhares de empresas privadas, repito, destruição de milhares de empresas privadas, em particular pequenas e médias, que têm trabalhado ao longo dos anos para que se efetivem as funções das autarquias e para efetivar direitos fundamentais aos portugueses.

É doloroso mas é um facto: estamos perante um retrocesso social e civilizacional muito perigoso, em que não são apenas as condições de trabalho, as condições de vida, as condições de estruturação da sociedade, mas também a democracia que é posta em causa.

Nós estamos mesmo num processo de retrocesso social e civilizacional profundo, de quebra do nível de desenvolvimento do país, e isso reflete-se nas condições de vida, nas condições de trabalho, nas dificuldades de acesso a direitos sociais fundamentais, mas também, por exemplo, em condições nos mais diversos campos da vida da nossa sociedade e na fragilização acelerada da democracia.

(…) Todas as gerações são afetadas, mas há uma geração que está mais em causa que as outras: é a geração mais jovem. O futuro torna-se muito complexo face a estas políticas. Por isso, deixamos um fortíssimo apelo à juventude, para que intensifique o seu esclarecimento sobre os problemas, a sua perceção das coisas e para que lute com todas as forças ao seu alcance. Não se pode impor esta coisa vergonhosa de lhes propiciar uma vida pior do que a dos seus pais e dos seus avós.

[Conferência Imprensa 14-10]

Estas medidas não vão reduzir a dívida do país, e é bom que todos tenhamos noção disso! Vamos fazer sacrifícios e no fim a dívida será maior. Os efeitos que resultam destas políticas são, como temos insistido, mais recessão económica e mais desemprego. E com recessão económica e desemprego não há melhorias das condições para pagar a dívida. Estão, como há muito tempo vimos chamando a atenção, a fazer aceleradamente o abaixamento do nível de desenvolvimento da sociedade portuguesa.

[Conferência Imprensa de 14-10]

“Acordai, acordai, homens que dormis a embalar a dor dos silêncios vis”! Um oportuno texto que é parte de um poema de José Gomes Ferreira - “escrito em tempos de escuridão” - citado por Carvalho da Silva em artigo publicado no JN.

Manuel Carvalho da Silva, Secretário-geral da CGTP-IN


Uma Greve Geral EM DEFESA DO EMPREGO, DOS SALÁRIOS E DAS PENSÕES

CONTRA A PROPOSTA DE ORÇAMENTO DE ESTADO E PELO DIÁLOGO E NEGOCIAÇÃO

Portugal está hoje confrontado com uma grave crise económica e social, como há muito não conhecíamos.

O Governo, invocando o Memorando assinado com a Troika, vem prosseguindo uma agenda própria, com medidas de austeridade e de desregulação laboral que vão muito além das constantes no Memorando e não aproveita minimamente os graus de liberdade que o mesmo permite. A redução do défice orçamental e a correção dos desequilíbrios externos são fundamentais para o País, mas não podem nem devem esgotar as políticas do País. 

A ausência de políticas de crescimento e emprego, bem como a profunda insensibilidade social ficaram bem patentes na Proposta de Orçamento de Estado 2012, que traduz um ataque brutal aos direitos dos trabalhadores e pensionistas e impõe uma profunda quebra dos seus rendimentos.

Os cortes dos subsídios de Natal e de Férias para os trabalhadores da Administração Pública, do Sector Empresarial do Estado (SEE) e todos pensionistas do Regime Geral, atingem mesmo aqueles que auferem salários e pensões muito reduzidos. São cortes que se traduzem numa redução salarial que, para salários superiores a 1000 Euros é de 15% em 2012, que se vai somar à redução média de 5% já verificada em 2011 para muitos. Mas mesmo as pensões e os salários mais baixos são reduzidos e os pensionistas e trabalhadores com 650 Euros perdem um salário (7%)!!!

Os trabalhadores do sector privado sofrem uma violenta desvalorização do valor do seu trabalho, pelo aumento do seu horário de trabalho em meia hora por dia (15 a 17 dias de trabalho não remunerado por ano), podendo o empregador pode dispor livremente deste aumento de horário. Contribuirá ainda, para o aumento do desemprego, agravado no actual contexto de recessão económica.

Isto significa mais e uma desvalorização salarial entre 6 a 7%. Mas isto significa também a destruição do horário máximo de trabalho de 40 horas semanais, difícil conquista dos sindicatos e trabalhadores portugueses, e a impossibilidade de uma verdadeira conciliação entre a vida profissional e a vida familiar e pessoal.

Realça-se que o OE 2012 vai penalizar também os trabalhadores e famílias portuguesas por outras vias, nomeadamente o agravamento dos impostos (IRS, IVA, IMI), a redução das prestações sociais e o corte muito significativo das despesas em áreas fundamentais como a Saúde e a Educação.

A proposta de OE 2012 não aponta caminhos de esperança para Portugal, mas sim para uma ainda mais acentuada recessão económica, para o aumento do desemprego, para o agravamento da pobreza e das desigualdades sociais, revelando a incapacidade do Governo para criar condições para um futuro com desenvolvimento económico e social.

Basta de imposição - A UGT exige diálogo e negociação

A UGT sempre se empenhou no reforço do diálogo social, na certeza de que a negociação a nível nacional, sectorial e de empresa, permite o encontro de soluções concertadas, que respondem melhor às necessidades das empresas e dos trabalhadores e permitem a conciliação entre a vida de trabalho e a vida familiar.

Mas, até agora não tem existido uma verdadeira Concertação Social, mas sim uma prática permanente do Governo de fuga à discussão das matérias fundamentais ligadas às áreas económicas e sociais e de sistemático desrespeito pelos compromissos assumidos.

A existência de um diálogo social forte, a par de um efectivo diálogo político, são pilares fundamentais do Estado de Direito Democrático. A política do “posso, quero e mando” não pode continuar a imperar.

A UGT está consciente que a saída da crise exigirá sacrifícios a todos os portugueses, mas não aceita que estes sacrifícios continuem a recair sempre os mesmos – trabalhadores, pensionistas e desempregados. É fundamental garantir uma justa repartição dos sacrifícios.

Os sacrifícios a fazer não podem ser em vão. Não apenas não podem comprometer o futuro do País, como devem antes criar uma verdadeira base para a retoma económica, a criação de emprego e melhores condições de vida e de trabalho para os portugueses.

Por isso é necessária uma Greve Geral para, entre outras:

-          Exigir mudanças profundas no Orçamento de Estado para 2012, visando uma distribuição equilibrada dos sacrifícios e combater o empobrecimento generalizado dos pensionistas e trabalhadores no activo a que o mesmo conduz;

-          Combater os cortes nos subsídios de Férias e de Natal;

-          Exigir o respeito pelos direitos dos trabalhadores da Administração Pública e do sector empresarial, público e privado;

-          Defender o Estado Social, em particular nas áreas da Saúde, Educação e Segurança Social e os Serviços Públicos;

-          Combater o aumento das desigualdades sociais, do desemprego e da pobreza e exclusão social;

-          Combater o aumento da precariedade laboral, que afecta os trabalhadores em geral e os jovens em particular;

-          Exigir políticas de Crescimento e Emprego;

-          Exigir políticas que dêem esperança no futuro às jovens gerações;

-          Exigir um diálogo social sério, quer na concertação social, quer na negociação colectiva.

Todos somos afectados pela injustiça das políticas e medidas deste Governo - trabalhadores do sector privado, do sector público, jovens, pensionistas, desempregados. Temos de permanecer unidos e combater quem hoje pretende dividir os trabalhadores e atacar os seus direitos, na certeza de que estaremos a criar condições para reverter as opções erradas que estão a ser tomadas.

Esta é uma Greve pela esperança no futuro de Portugal, por um diálogo social que leve a mais crescimento, a mais e melhor emprego, a uma política de rendimentos que promova a justiça social, a solidariedade e o combate à pobreza e às desigualdades.

As nossas saudações e agradecimento ao Sindicato dos Professores da Grande Lisboa pela acção que vem conduzindo na defesa dos trabalhadores que representa e pela mobilização que está a conduzir na defesa da Greve Geral.

João Proença

Secretário Geral da UGT