Frágil Democracia
Em tempos de emergência ou calamidade surgem por vezes interpretações duvidosas, e amiúde perigosas, a respeito do que deve ou não ser decretado relativamente aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Uma coisa é certa, ou devia ser, em democracia nunca é necessário limitar os direitos básicos dos cidadãos. Os direitos são o cerne da democracia e privados deles não a vivemos plenamente.
Dito isto, considero que os atentados aos estados democráticos levados a cabo à boleia da não limitação de direitos, liberdades e garantias que caracterizam essas mesmas democracias não podem ser tolerados.
Refiro-me ao deputado do Chega e ao seu permanente ataque ao texto constitucional português, não para que se proceda a uma remodelação de um ou outro aspecto em particular mas sim para o arrasar por completo, desvirtuando, por essa via, a democracia vigente no nosso País.
Esta tentativa não pode ser calada, como defendem alguns, ingenuamente, a pretexto de que se dá demasiada visibilidade e notoriedade à figura.
Remeto e recomendo, a este amplo propósito, para um artigo de opinião de Isabel Moreira no Expresso, em que denuncia de forma bastante veemente a atitude necrófaga e populista desta figura nefasta, relativamente ao aproveitamento e apropriação da desgraça alheia, de que todos ainda estamos a cumprir nojo, acontecida recentemente perto de Peniche.
No meu entender estas figuras, avessas à democracia, seja por que ângulo de análise for, devem ser denunciadas e combatidas todos os dias.
Trata-se de um manipulador perigoso, lembremos a história europeia do século 20, que apela aos instintos primários do nosso paleo-cérebro e que já demonstrou não estar balizado por qualquer confinamento ético ou valorativo.
Deixá-lo fazer o seu caminho, a pretexto de não lhe dar demasiada importância e visibilidade, pode vir a revelar-se trágico para o regime político português num futuro não muito distante. Atentemos ao que se está a passar na Hungria e na Polónia e ao crescimento de anti-figuras semelhantes em Espanha e Itália.
Não sei bem como, confesso, mas a democracia não pode tolerar comportamentos destes. As democracias modernas não podem ser autofágicas. Há que criar imunidades "democráticas" para este tipo de contaminação.
Temos que ser capazes de injectar, todos os dias, este tipo de anticorpos na imensa linfa planetária que nos defende.
Ricardo Furtado