Artigo:Esplanadas precisam-se!

Pastas / Informação / Todas as Notícias

Esplanadas precisam-se!


“Recuperar aprendizagens? “É preciso alertar as Finanças de que é preciso investimento”: este é o título de um artigo que ocupa meia página (pág. 16) no Jornal “Público” de hoje. Até lá chegar, na foto de capa uma esplanada em que pessoas desfrutam finalmente da alegria do ar livre, do convívio mesmo que limitado, de um café, uma água ou uma cerveja num dia luminoso de sol, em que finalmente se põe a conversa em dia. Ao contrário da fotografia da capa de ontem em que as cadeiras ainda estavam empilhadas, hoje dá-se largas ao novo desconfinamento. A nossa língua sempre rica e criativa já criou um novo verbo: esplanar ou esplanadar…
O facto de hoje passarem 10 anos sobre o “resgate” da Troika, levou o corpo editorial do “Público” a dedicar algumas páginas do diário a lembrar-nos o processo e a recordar alguns dos rostos da austeridade: o holandês Dijsselbloem, o alemão Schäuble, Victor Gaspar, Maria Luís Albuquerque, Passos Coelho, Paulo Portas… E a lembrar-nos que hoje, passados 10 anos e mesmo com uma “geringonça”, muitas leis não foram destroikadas e houve retrocessos profundos longe de serem revertidos.
Mas voltemos às escolas e à alegria do regresso, porque a alegria não é só feita de esplanadas, mas também do reencontro com os lugares de sociabilização e crescimento que são as escolas. O “Público” de ontem dedicou duas páginas às escolas e titulava “Mais de 5 mil alunos sem condições para ensino à distância”, apontando para vários factores: o ensino à distância não é eficaz para muitos, os riscos de abandono, as faltas de ligação à internet e ambientes familiares inadequados.
No artigo de hoje, com cujo título o meu pequeno texto começa, vários actores se pronunciam sobre o problema da recuperação das aprendizagens, depois de um período tão longo de afastamento. O IAVE fez um estudo, investigadores com palco mediático opinam, sindicatos, confederações de pais, associações de directores escolares, todos têm algo a dizer sobre o caminho a seguir. Estranha-se que o Conselho Nacional de Educação, um órgão independente com funções consultivas e cuja missão é emitir recomendações e pareceres sobre questões relacionadas com a Educação, tenha sido substituído por um grupo de trabalho com pessoas nomeadas pelo governo e que são alheias à comunidade educativa. Como acontecera logo no primeiro período, quando o ME fez letra morta das propostas da FENPROF que apostavam no reforço de apoios aos alunos com mais dificuldades, na contratação de mais profissionais e na redução de alunos por turma, o ME continua a desvalorizar o saber das próprias escolas sobre as suas realidades específicas ao mesmo tempo que enche a boca com a autonomia e a confiança nas escolas para superar os estragos da pandemia.
A recuperação das aprendizagens vai ser um processo longo. Nada fácil. A tudologia que ganhou grande impacto nestes tempos de pandemia tem soluções milagrosas como administrar doses de conhecimento em cursos de verão, ou ir buscar recém-licenciados que de pedagogia nada sabem (mas para quê a pedagogia?) para serem tutores de pequenos grupos de alunos. A ideia de diminuir programas monstruosos, de abolir exames e provas desnecessárias, a ideia de fazer diferente ajustando o ensino ao actual estado do mundo talvez fosse uma boa ideia. Simplificar, ajustar. Afinal fala-se tanto da saúde mental das crianças, dos jovens, mas muito pouco ou quase nada se vê nesse sentido.
6 de Abril de 2021

Almerinda Bento