Artigo:ESCOLA INFORMAÇÃO Nº 251

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DOS MOMENTOS DIFÍCEIS. DA UNIDADE



No passado dia 24 de março tive a possibilidade de participar nas comemorações do 50º aniversário da crise académica de 1962, numa sessão que decorreu na Reitoria da Universidade de Lisboa. Claro que não vivi diretamente esse processo – era ainda uma criança. Mas à medida que ia lendo os textos, os dados, as fotos com que se compôs a exposição desse processo de luta – uma luta de grande heroísmo – cimentava-se em mim uma ideia central: a de que para superar momentos difíceis é imprescindível ter uma definição muito clara e firme dos objetivos a atingir e uma enorme lucidez que permita a unidade em torno do essencial, não deixando que o esforço coletivo tropece em questões menores que nos dividam. Aqueles estudantes – e alguns poucos professores – sabiam o que queriam e acreditavam firmemente nos ideais de liberdade que os moviam: por isso sofreram as agressões, as prisões, as expulsões das universidades. Por isso foram capazes de reforçar a sua unidade em torno desses ideais. A vida política posterior – adquirida em 1974 a liberdade por que eles tanto lutaram – separá-los-á por diferentes partidos. Mas tenho a certeza de que todos eles se reconhecerão como obreiros comuns de um ideal que os uniu.


Vivi mais direta e empenhadamente a crise académica de 1969, de que certamente se fará também a devida análise histórica. Recordar estas duas “datas” ajuda-me a ser um pouco mais otimista: os momentos difíceis que hoje atravessamos não o são mais do que os anos de 62 e 69. Tal como então seremos capazes de os superar se definirmos com clareza os grandes objetivos por que temos de lutar, se acreditarmos firmemente nesses ideais e se tivermos a lucidez de acentuar o que nos une em vez de cavarmos fossos que nos isolem. Custa ver como defensores comuns do papel insubstituível do estado na oferta dos serviços públicos – nomeadamente de uma escola pública de qualidade para todos – se digladiam, deixando o campo livre à direita ultraliberal que vai destruindo o edifício de justiça social que tão empenhadamente fomos construindo com a revolução de abril. Devia magoar-nos o facto de as esquerdas não serem capazes de se unir em torno do essencial, antes fazerem gala das suas diferenças transformadas em antagonismos insuperáveis.

Em nome de uma sociedade mais justa, que se oponha à cavalgada ultraliberal que varre toda a Europa, é indispensável que a unidade cimente as nossas esparsas forças, seja no campo sindical, no campo social ou no domínio da política propriamente dita. Uma unidade que não escamoteie as diferenças mas que as torne em elementos de reforço. 

Que a dura luta dos estudantes em 1962 nos sirva de exemplo – é para isso que devem servir as “comemorações”.