Artigo:ESCOLA INFORMAÇÃO Nº 269 . julho 2015

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Despacho de organização do ano letivo

A última oportunidade ou cegueira ideológica?

José Alberto Marques . Diretor Escola Informação



O Ministério da Educação e Ciência (MEC) perdeu, com a publicação recente do Despacho Normativo 10-A/2015, de 19 de junho (despacho de organização do ano letivo 2015/2016 – DOAL) neste final de legislatura, a sua última oportunidade para efetivamente criar melhores condições de trabalho nas escolas procurando desta forma contribuir para a dignificação da profissão docente e a melhoria da qualidade do ensino e dos resultados da aprendizagem dos alunos, promovendo assim o combate ao abandono escolar precoce.
Entre 2011 e 2015 a Educação, particularmente a Escola Pública, sofreu uma enorme depauperação de recursos que muito prejudicou o seu funcionamento. Os cortes orçamentais foram assim o instrumento privilegiado da política neoliberal de reconfiguração do Estado e consequentemente da educação pública. Encerrar escolas, agrupar outras, aumentar o número de alunos por turma, reduzir currículos e acabar com algumas disciplinas permitiu ao governo atirar milhares de docentes para o desemprego e enfraqueceu a Escola Pública. Por outro lado, assistiu-se ao aumento do trabalho burocrático atribuído aos professores, em detrimento da vertente pedagógica, ao mesmo tempo que se desregularam as condições e horários de trabalho e se desvalorizaram os salários, medidas que, entre outras, levaram milhares de docentes a aposentarem-se prematuramente.
Com este pano de fundo esperava-se que o MEC, pelo menos em ano de eleições legislativas, fosse para além da retórica preambular do referido despacho e tivesse a coragem de concretizar no seu articulado os aspetos que aí contempla. Analisando cuidadosamente o DOAL verifica-se que tudo continua igual. Apenas se apresentam mais algumas horas a prestar pela equipa TIC para manutenção e gestão dos recursos tecnológicos, estando estas, no entanto, dependentes do número de horas de redução a que estes professores têm direito ao abrigo do art.º 79º do ECD. Na prática, esta redução, prevista no Despacho Normativo, pode ser igual a zero.
O que se tem verificado com os horários e condições de trabalho dos docentes é uma violação clara da Constituição da República Portuguesa, nomeadamente no que concerne à alínea b) – ponto 1 do art.º 59º (direitos dos trabalhadores), violação a que urge pôr termo. A CRP é clara: – “Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito: A organização do trabalho em condições socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar”
Os docentes, e a Escola Pública, precisam é que lhes criem condições para poderem realizar o seu trabalho pedagógico de forma digna. Só assim se pode garantir a qualidade da educação que queremos proporcionar aos futuros cidadãos deste país.
O MEC ainda tem o tempo necessário para corrigir este despacho. Na ausência de vontade política da sua parte teremos de ser nós a obrigá-lo