De quanta invisibilidade se faz uma cidade
No artigo /entrevista de João Biscaia do Jornal Setenta e Quatro a Filipa Bolotinha, Coordenadora Geral da Associação Renovar a Mouraria, ficamos a conhecer as condições em que vivem e trabalham as pessoas migrantes que sustentam e economia da cidade de Lisboa.
Logo no título do artigo somos remetidos/as para as “condições miseráveis” em que vivem estas pessoas que “são os imigrantes que sustentam a economia lisboeta, mas não usufruem dos direitos que lhes são devidos numa sociedade”. Há desta forma um mundo visível que é suportado por um outro mundo invisível ao comum das pessoas no que diz respeito às condições de trabalho e habitação. “Uma realidade ignorada, quando são estas pessoas que sustentam o modelo de desenvolvimento da cidade”
A exploração e a desumanização a que estão sujeitas as pessoas em situação de vulnerabilidade leva-as a aceitar trabalhos sem condições e mal pagos, porque quem imigra “Foge de uma situação pior que aquela que encontra cá e sujeita-se a esta por ver uma luz ao fundo do túnel. Crê que é temporária, que as coisas vão mudar. Nos seus países de origem talvez não haja essa possibilidade de ter esperança, principalmente se pensarmos nas mulheres e nas limitações às suas liberdades”.
Na Associação Renovar a Mouraria fazem um acompanhamento das pessoas prestando uma “solidariedade que não se baseie em dar comida”, mas em todo um apoio jurídico, apoio à empregabilidade e de integração que contam com mediadoras para esse efeito. É ainda referido que as pessoas “Acompanham com cuidado e atenção a educação dos seus filhos, apesar da barreira linguística e apesar de todo o apoio extra escolar que é prestado”, Filipa Bolotinha refere ainda que “ o que falta, por exemplo, é um plano nacional de ensino da língua portuguesa para migrantes, sejam crianças ou adultos.”
Há um modelo social e económico que tem por base o trabalho invisível, precário e um conjunto de pessoas que vivem sem direitos à habitação, saúde, educação e outros num sistema que permite e acentua as desigualdades. A crise da habitação, o aumento dos preços e os baixos salários promovem níveis existenciais de sobrevivência para grande parte da população imigrante, sendo que “O que está a acontecer agora é especialmente preocupante pela sua dimensão e pela desumanização que implica”
No “eixo Arroios- Anjos – Mouraria é onde vive a esmagadora mão-de-obra que sustenta o modelo de negócio desta cidade: restaurantes, cafés, estafetas, condutores de TVDE, hotéis, tuk-tuks. Todas estas pessoas que fazem os portugueses dizer que Lisboa está muito melhor e mais bonita.”
Filipa Bolotinha refere ainda que “Gostaria que a população imigrante – cujo trabalho sustenta o negócio do turismo e da hotelaria – fizesse greve durante uma semana, para ver o que aconteceria à cidade de Lisboa”
Cuidar da cidade é cuidar das pessoas que nela habitam não permitindo que o bem-estar de uns seres humanos se faça em cima da exploração de outros seres humanos e porque “Se não promovemos a devida integração destas pessoas, promovemos diretamente a sua exploração como mão-de-obra-barata e desumanizada e isso não pode ter espaço na nossa democracia” .
Albertina Pena