Artigo:Componente letiva e não letiva do pessoal docente

Pastas / Legislação / Consultório Jurídico

Componente letiva e não letiva do pessoal docente

A escolha do tema a tratar na presente rubrica decorre do facto de a mesma constituir atualmente uma das que mais contestação tem merecido por parte do pessoal docente. Isto deve-se essencialmente ao facto de o quadro legal em vigor inserir na componente não letiva dos professores atividades que, por se desenvolverem diretamente com alunos, deviam estar integradas na respetiva componente letiva.
Na verdade, o Estatuto da Carreira Docente (doravante ECD) determina no seu artigo 76º que o horário semanal dos docentes é de 35 horas semanais e integra duas componentes (a letiva e a não letiva) sendo que esta última abrange a realização de trabalho individual e a prestação de trabalho a nível do estabelecimento escolar.
Parece não oferecer dúvidas que a principal das referidas componentes é a letiva já que é a que integra e define a função primordial da docência que é a de ensinar. Por sua vez, a componente não letiva, não sendo de somenos importância, não deixa de ser uma extensão da primeira e de alguma forma estar a esta subordinada. Ora, de acordo com o artigo 82º do ECD, na redação que lhe foi dada pelo DL nº 15/2007, de 19 de janeiro, esta componente não letiva abrange, como foi referido, não só o trabalho a nível individual (que pode compreender a preparação de aulas, a avaliação do processo ensino-aprendizagem e investigação de natureza pedagógica) mas também o trabalho a nível do estabelecimento de ensino.
O que sucede é que, no elenco legal das atividades que integram esta última vertente da componente não letiva, existem algumas cuja inclusão nesta é inaceitável por subverter por completo a organização do horário dos docentes. São elas as constantes, respetivamente, nas seguintes alíneas da norma em questão:
“a) A colaboração em atividades de componente curricular que visem promover o enriquecimento cultural e a inserção dos educandos na comunidade;
b) A informação e orientação educacional dos alunos em colaboração com as famílias e com as estruturas escolares locais e regionais;
(…)
e) A substituição de outros docentes do mesmo agrupamento de escolas ou escola não agrupada na situação da ausência de curta duração (…);
(…)
j) O acompanhamento e a supervisão das atividades de enriquecimento e complemento curricular;
(…)
l) A orientação e o acompanhamento dos alunos nos diferentes espaços escolares;
m) O apoio individual a alunos com dificuldades de aprendizagem”.
Na verdade, as atividades incluídas nas alíneas a), b), e l), na parte em que têm que ser asseguradas por docentes, devem no melhor entendimento, ser incluídas na componente letiva por se enquadrarem na “área curricular não disciplinar” a que se reporta a parte final do nº 2 do artigo 78º do ECD, a propósito da organização da componente letiva. Por sua vez, a substituição de outros docentes para desempenhar funções letivas também constitui, sem margem para dúvidas, uma atividade a incluir na componente letiva do substituto já que, como é óbvio, tal substituição tem apenas em vista assegurar a carga letiva que o outro docente não pode cumprir. Finalmente, as atividades inscritas nas alíneas j) e m) supra transcritas também são claramente enquadráveis no conceito da componente letiva, de acordo com o citado artigo 78º, nº 2 do ECD, já quer as mesmas se reportam expressa e respetivamente, à “área curricular não disciplinar” e ao período de lecionação das disciplinas para alunos com dificuldades de aprendizagem. Há pois que concluir que é apenas na componente letiva dos docentes que devem ser enquadradas as atividades desenvolvidas diretamente com os alunos na sua componente curricular ou que dela decorrem ou a visem reforçar (mesmo que realizadas fora da sala de aula).
Assim e sem prejuízo de se continuar a insistir numa alteração legislativa que corresponda à correta definição do conteúdo do horário dos docentes e da respetiva organização, sempre poderão os mesmos reagir requerendo que o trabalho de cariz claramente letivo mas legalmente qualificado como não letivo seja pago como extraordinário, como aliás já foi entendimento de alguma Jurisprudência Administrativa.
Para o efeito, poderão os docentes, nestas circunstâncias, recorrer ao Serviço de Apoio a Sócios do SPGL com vista à marcação de uma consulta jurídica para avaliação e acompanhamento do seu caso concreto.