Clima utópico
Da COP27 resultaram anúncios importantes: mil milhões de euros para ajudar o continente africano a adaptar-se às alterações climáticas; criação da Aliança Global das Renováveis, para acelerar a transição energética e reduzir a dependência do gás russo; pressão da Índia, embora sem êxito, para que a COP27 determinasse o fim de todos os combustíveis fósseis; passagem de Portugal a membro efectivo da BOGA (Beyond Oil and Gas Alliance) que impede a exploração de combustíveis fósseis.
No plano dos desejos, Ursula von der Leyen reafirmou o compromisso de tornar a Europa o primeiro continente com neutralidade climática até 2050, embora não se tenha sequer chegado a acordo quanto ao limite do 1,5°C. O primeiro-ministro português, achando 2050 demasiado longínquo, antecipou para 2045 as nossas metas da neutralidade carbónica, pondo-nos na dianteira mundial do combate às alterações climáticas. Se, por um lado, as utopias não têm limites, também já se sabe que os nossos governantes gostam de ir além da troika.
Em dois anos foi possível encerrar as nossas centrais a carvão e, segundo António Costa, os preços da electricidade em Portugal estão mais baixos que a média europeia, porque 60% da energia tem origem em fontes renováveis, estimando que, em 2026, já seja 80%. O famoso optimismo do primeiro-ministro, agora BOGA convicto, baseia-se ainda na progressiva substituição do gás natural pelo hidrogénio na indústria.
Perante todas estas boas intenções, que pode o jovem cidadão fazer, individualmente ou em associação activista? Exigir a demissão do ministro da Economia e do Mar, pois claro. Qualquer um percebe a relação entre o aquecimento global e a continuação em funções de Costa e Silva. Basta fornecer-lhe a carta de demissão que, uma vez assinada, baixará logo o nível do mar.
É fatal o aproveitamento da oportunidade mediática de protestos juvenis bem-intencionados, e tão voluntariosos como impreparados, por agendas político-partidárias de oposição ao governo e por activistas que apenas se comprazem em coleccionar detenções e processos por desobediência civil. Mas os protestos que surgem agora já eram urgentes ontem e estes jovens não se podem deixar remeter ao papel de idiotas úteis a bandeiras que lhes são alheias. Nada adianta vir para a rua exigir impossíveis como a neutralidade carbónica até 2030, sem ao menos apontar uma estratégia. Se a causa é a defesa do clima, então há que visar os poluidores e apresentar soluções. É claro que tal exige estudo e seriedade, algo bem menos “disruptivo” do que colar as mãos à parede ou ocupar edifícios públicos.
É preciso vir para a rua, sim, mas com propostas realistas que contribuam para tornar a utopia da neutralidade carbónica um pouco mais tangível.
Francisco Martins da Silva