Artigo:Calcanhar de Aquiles

Pastas / Informação / Todas as Notícias

Calcanhar  de Aquiles

Dicotomia a explorar em tempos pré-pré-eleitorais, inspirada numa formulação televisiva de Morais Sarmento: António Costa (PS) dá braço ao BE e PC, ambos partidos revolucionários, ambos com um passado e base ideológica enraizado em experiências de socialismo real catastróficas. PSD e CHEGA assumidamente noivos, sim, trazendo o racismo, a xenofobia, a matriz salazarista assumida para o seio do arco da governação. Segundo Morais Sarmento, pelo que pude perceber, considera esta jogada do PSD uma questão de simetria política, perfeitamente legítima e, até, necessária ao restabelecimento de uma certa justiça: se o PS pode beneficiar dos extremismos de esquerda, porque não poderá o PSD beneficiar dos de direita?

Morais Sarmento, claramente, coloca em plano de igualdade, os “defeitos” de extrema esquerda e extrema direita, no seu dizer, isto é, o instinto “coletivizador” dos primeiros anula-se nos racismos e outras aleivosias de direita, numa espécie de “bem-feita”, “para sacana, sacana e meio”, “toma lá que já almoçaste”.

Claro que, todos sabemos, ao que este arco de governação de direita tem a seta apontada - ao Estado Previdência, aos direitos laborais -, e quais são os senhores que já untam as mãos destes partidos para que as leis certas sejam um dia paridas pelos escritórios de advogados habituais.

Mas, no caminho, a linguagem faz os seus estragos, arregimentando aquilo que Hanna Arendt apelidou de “ralé”, para quem os valores do Estado de Direito e do Iluminismo não passam de obstáculos para aquele mundo por que anseiam, simples e compreensível, governado por um homem forte, carismático, a quem dá prazer obedecer de forma unívoca e apodíctica.

É isso que o PSD está a fazer, a apontar o calcanhar de Aquiles da Democracia. Bastava-lhe olhar para o lado de lá do Atlântico e por a mão na consciência, ver como não se pode, não se deve, jamais, dar alimento ao monstro, emagrecendo aqueles que o poderiam manter na sua dimensão mínima.

O PSD vai ajudar o CHEGA a crescer, a legitimar-se, a enraizar-se, pois o CHEGA é a corporização política de factores políticos profundos na sociedade portuguesa que se encontravam mais ou menos dispersos e diluídos.

Pode ser que se venha a arrepender.  

João Correia