Breve apontamento sobre o que ocorreu no sistema educativo logo após o 25 de Abril de 1974
… Era a semente da esperança
feita de força e vontade
era ainda uma criança
mas já era a liberdade …
Ary dos Santos, 1975. Ed. Comunicação
Tinha 31 anos, 9 anos de professora provisória, lutava pelos direitos dos professores nos Grupos de Estudo do Pessoal Docente do Ensino Secundário, GEPDES, desde 1969 e na memória desse início de vivência em liberdade como docente, recordo as alterações no nosso quotidiano.
A gestão das escolas passou para a responsabilidade dos docentes eleitos pelos seus pares, foi dada liberdade de associação e de criação de sindicatos livres e democráticos, nos grupos disciplinares os professores podiam reunir para tomarem decisões quanto aos manuais a adotar, planificarem em conjunto, decidirem qual a melhor forma de disposição das carteiras na sala de aula, qual o modelo pedagógico a seguir, desenvolver a metodologia de projeto, implementar o ensino individualizado e diferenciado e eleger os seus representantes nos órgãos de gestão das escolas.
O ensino passou a ser unificado e implementa-se a coeducação. As escolas passam a ser escolas do primeiro ciclo, do ensino básico e do ensino secundário. A avaliação deixa de se centrar nos exames e passa a ser contínua.
Podíamos, finalmente, falar alto e expressar as nossas ideias e pensamentos. Esta é a memória desse dia e do que os professores fizeram, que devemos preservar.
... De tudo o que Abril abriu
ainda pouco se disse
e só nos faltava agora
que este Abril não se cumprisse…
Ary dos Santos, 1975. Ed. Comunicação
Mas estas transformações não estão garantidas e para que as possamos compreender melhor e lutar para que não as percamos como é o caso da gestão das escolas, da revisão do Estatuto da Carreira Docente, da falta de um modelo de formação de professores etc, recordemos, brevemente o que era a escola antes de 25 de Abril de 1974.
No Estado Novo reduz-se a escolaridade obrigatória, proíbe-se a coeducação, extinguem-se as associações de professores, afastam-se os professores que não são da confiança do regime, encerram-se as escolas normais, estabelecem-se códigos de conduta, impõem-se juramentos aos professores, institui-se o livro único, cria-se a Mocidade Portuguesa e o Canto Coral. O sistema de ensino era regulado por manuais escolares únicos. A excelência do ensino era conseguida, quase sempre, pela força da memorização de conteúdos, da intimidação, da humilhação e dos castigos corporais. Uma das características era a existência de salas de aulas com carteiras alinhadas, muitas vezes aparafusadas ao chão. Havia um estrado alto, em madeira, e uma secretária elevada para o professor, para demonstrar a sua superioridade em relação aos alunos. Nas paredes existiam os retractos de Salazar e posteriormente de Marcello Caetano e do Presidente da República. No meio existia sempre um crucifixo. Os diretores e reitores eram nomeados e da confiança do governo.
50 anos passados é num movimento sindical forte e centrado nas escolas que devemos gritar bem alto como o poeta
... agora ninguém mais cerra
as portas que Abril abriu!
Ary dos Santos, 1975. Ed. Comunicação
Maria Manuel Calvet Ricardo
Janeiro 2025