Abril, uma utopia a meio do caminho
Na sua página habitual do Público – a última – Rui Tavares titula a sua crónica de hoje, 27 de abril, “Portugal, utopia real”. Escreve que “Portugal foi então (com o 25 de Abril) uma utopia real e de certa forma continua a ser”. E esclarece o que entende por utopia real: “Uma utopia real não responde a todas as perguntas nem resolve todos os problemas (…) Mas quando olhamos para trás vemos que se deram respostas e se resolveram problemas que antes se julgou ser impossível superar”. R. Tavares tem certamente razão. Mas eu gostaria de sublinhar a cantiga do Sérgio Godinho: ”Só há liberdade a sério quando houver a paz, o pão, a habitação, saúde, educação… quando pertencer ao povo o que o povo produzir”. Ou seja, estamos muito longe de realizar a utopia que Abril abriu. Acabou a guerra colonial, mas um desacreditado primeiro-ministro envolveu-nos no crime que foi a agressão norte-americana ao Iraque; temos mais pão, mas ele continua muito mal distribuído e há grandes bolsas de pobreza; acabamos com a maior parte das barracas e “legalizamos” bairros clandestinos, mas é nas grandes cidades que a habitação é hoje um dos maiores problemas; quanto à educação, o progresso foi fenomenal, mas a desigualdade no acesso e no sucesso motivada pela desigualdade económica continua a ser preocupante. E o que o povo produz continua claramente a não lhe pertencer, abocanhado que continua por uns tantos capitalistas…
É por isso que a Liberdade que conquistamos ainda não é “uma Liberdade a sério”. Aliás, por outras palavras, talvez mais comedidas, o texto de Rui Tavares reconhece. É só questão de sublinhar. Ele sublinha o que foi feito; eu o que ainda falta fazer.
António Avelãs