Artigo:Escola Informação Digital Nº 21, fevereiro 2019

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O M.E. e o descongelamento da carreira docente

Compromissos violados, mentiras, ameaças
e bloqueio total


José Alberto Marques . Diretor Escola Informação


A história é conhecida, mas talvez seja importante recordá-la, a traço grosso e rápido, num momento em que a Federação Nacional dos Professores, após a reunião de 4 de março passado com o governo, declarou para a ata respetiva que “face ao bloqueio imposto pelo governo a uma negociação efetiva, respeitadora da lei e da vida profissional dos docentes, a FENPROF considera que a realização de negociação suplementar constituiria perda de tempo, razão por que não a irá requerer”.
É o fim de um processo negocial com quase um ano e meio e que foi sempre tudo menos negocial! Em outubro de 2017, a proposta de Orçamento de Estado para 2018 previa o descongelamento das progressões nas carreiras da administração pública. Mas, no caso dos docentes, a recuperação integral do tempo de serviço de acordo com o seu estatuto de carreira não ficava esclarecida. Na madrugada de 18 de novembro, ao fim de uma maratona negocial com o ME que durou 10 horas, o Governo e os sindicatos assinaram uma declaração de compromisso. A 15 de dezembro, o parlamento aprovou uma resolução apresentada pelo Partido Ecologista Os Verdes sobre a contagem de todo o tempo de serviço para efeitos de progressão nas carreiras da Administração Pública, tendo especialmente em vista o caso dos docentes. A resolução aprovada recomendava ao governo que “em diálogo com os sindicatos, garanta que, nas carreiras cuja progressão depende também do tempo de serviço prestado, é contado todo esse tempo para efeitos de progressão na carreira e da correspondente valorização remuneratória”. A 28 de fevereiro de 2018, o governo propôs que os professores recuperassem apenas 2 anos, 9 meses e 18 dias. E a 12 de março, no final de nova ronda negocial mais uma vez de sentido único, o governo justificou, numa nota explicativa, a sua proposta: “nas carreiras gerais, um módulo padrão de progressão corresponde a dez anos. Na carreira docente, o módulo padrão é de quatro anos. Assim, os sete anos de congelamento, que correspondem a 70% do módulo de uma carreira geral, traduzem-se em 70% de quatro anos na carreira docente, ou seja, dois anos, nove meses e 18 dias”. Esta proposta violava, e viola, uma vez que continua em cima da mesa, todos os princípios que devem presidir a qualquer processo negocial. Faz tábua rasa do tempo efetivamente congelado (9 anos, 4 meses e 2 dias), põe grosseiramente em causa o Estatuto da Carreira Docente e desrespeita as decisões da Assembleia da República vertidas no artigo 19º do Orçamento de Estado para 2018.
A luta sem tréguas dos docentes obrigou o governo a sentar-se à mesa com os sindicatos por diversas vezes no último ano, mas a postura deste foi sempre a de bloqueio total. As justificações para este bloqueio é que foram variando ao longo do tempo. Quer devido à posição firme dos sindicatos, quer devido à pressão da própria Assembleia da República que tem sido desrespeitada nas suas decisões. As sucessivas reafirmações de boa-fé negocial do governo, repetidas nesta última reunião de 4 de março passado, levaram a FENPROF a perguntar com que boa-fé esteve o governo na Declaração de Compromisso, assinada em 18 de novembro de 2017, se, em 15 de dezembro de 2017, um mês depois, estava a partir do zero. Quem mentiu? A secretária de estado que assinou o compromisso, e que defendeu a posteriori que os 2 anos, 9 meses e 18 dias estiveram sempre em cima da mesa, ou o ministro que diz que o governo evoluiu do zero para os tais 2 anos, 9 meses e 18 dias? E que dizer das ameaças do ministro da educação de voltar ao zero se os sindicatos não aceitassem os tais 2 anos, 9 meses e 18 dias? A ameaça como forma de “negociação”? E a afronta à Assembleia da República, ao aprovar exatamente a mesma coisa que a AR já tinha entendido não respeitar o OE de 2018?
Perante um governo que se recusa a negociar o prazo e o modo de concretizar a recuperação de todo o tempo de serviço, um governo que desrespeita tudo e todos, que usa todos os meios (desde a ameaça à mentira) para manter o bloqueio negocial e que não hesita em avançar, de novo, com uma solução injusta, sem qualquer fundamentação, e que irá provocar um mar de ultrapassagens entre os docentes, só resta aos professores e educadores o reforço da luta em todas as suas dimensões!