Artigo:Aulas e apoio aos alunos à distância: sobre a gravação e transmissão em direto de aulas

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Aulas e apoio aos alunos à distância: sobre a gravação e transmissão em direto de aulas

No quadro atual de pandemia, em muitos e variados estabelecimentos de educação e ensino, públicos e privados, quando uma turma ou alguns alunos são mandados pela autoridade de saúde para quarentena ou isolamento profilático, por ter surgido alguém infetado ou em contacto com alguém infetado, coloca-se a questão de como podem os alunos continuar a manter contacto com a escola (aulas ou apoios) e quem é responsabilizado por essas aulas e apoios.

Esta é uma questão que também se coloca com o acompanhamento dos alunos que não podem ir à escola por serem considerados de risco ou por padecerem de doença grave prolongada.

Ao continuar o projeto do estudo em casa, o ME pretende dar acompanhamento aos alunos que estão em casa, como é referido no documento de apresentação do projeto: “Assim, independentemente de se preservar o ensino presencial como modalidade de ensino privilegiada, estes conteúdos televisivos serão um apoio para os alunos que estiverem em casa, bem como um recurso para todos aqueles que queiram aceder a um conjunto de blocos pedagógicos e até como ferramenta pedagógica para os professores em ensino presencial.”

A transmissão direta da aula que vai aparecendo como solução para os alunos que não podem assistir presencialmente é muito questionada pelos professores dado o risco que representa em termos de violação dos direitos à imagem, à reserva de identidade de professores e alunos. Acrescenta-se o risco de os professores verem gravado, adulterado e divulgado o seu trabalho através das redes sociais, como aliás aconteceu no ano anterior agora acrescido do facto de o docente, manifestamente, ter dificuldade ou não conseguir controlar o grupo de alunos em regime presencial e, ao mesmo tempo, os alunos que estão a assistir à aula à distância.

Por outro lado, esta situação de transmissão de aulas é um processo que acentua as desigualdades e assimetrias, uma vez que nem todos os alunos terão equipamento e acesso à internet adequado, nem as condições de habitabilidade necessárias.

Não abdicar das nossas condições de trabalho, do nosso direito à reserva da identidade e da imagem é lutar pela valorização da profissão docente. É neste contexto que havendo orientações diferentes por parte das direções das escolas para um mesmo problema, muitos são os professores que colocam ao sindicato questões sobre a legalidade das medidas adotadas, direitos e obrigações profissionais neste novo quadro.

Entendemos, pois, necessário sistematizar e divulgar alguma informação e reflexão sobre o trabalho, os direitos e os deveres dos docentes neste tempo de grande instabilidade no processo de ensino- aprendizagem.

1. A autoridade de saúde decide que toda a turma entra em quarentena

Neste caso, nas escolas onde foram criadas condições para os professores fazerem sessões síncronas, tem sido mais ou menos pacífico que o professor da turma/disciplina dá a aula à turma no horário estipulado, organizando-a de acordo com a metodologia que adotar.

2. A autoridade de saúde decide que apenas um ou alguns alunos entram em quarentena, ficando os restantes alunos na escola em aulas presenciais

Os alunos em causa têm direito a manter a sua atividade escolar, embora de forma diferenciada – à distância.

A ideia de que o aluno deve manter esse contacto assistindo em direto às aulas, através de uma câmara colocada na sala de aula, não é a solução.

Tal modalidade não parece enquadrar-se em qualquer dos regimes definidos no ponto 6 da Recomendação do Conselho de Ministros 50-D/2020 de 20 de julho. Não pode, pois, o professor ser obrigado a aceitar essa situação, nem é razoável, em termos de aprendizagem, que um aluno se veja obrigado a visualizar aulas durante um número consecutivo de horas, como se estivesse na escola, pois o contexto do ensino presencial não é o mesmo.

Recorde-se que, de acordo com recomendações da UNESCO para o ensino a distância, as sessões síncronas não devem ter mais de 20 minutos no ensino básico nem mais de 40 minutos no ensino secundário.

Sendo certo que os alunos têm direito a continuar as suas aprendizagens e as escolas, através dos respetivos professores, o dever de os apoiar, há métodos adequados para o fazer:

a) Ou através de sessões síncronas e assíncronas devidamente preparadas para o efeito.

b) Ou, estando em pleno funcionamento o Estudo em Casa transmitido pela televisão – RTP Memória ou RTP Play os alunos poderão acompanhar as sessões transmitidas para o ano de escolaridade/disciplina respetivos disponibilizando a escola o apoio a esses alunos pelos respetivos professores, nomeadamente em sessões síncronas ou assíncronas.

3. Acompanhamento dos alunos que por serem considerados de risco e/ou não podem ir à escola por padecerem de doença grave prolongada.

Sendo certo que esta era uma situação que já existia e era acompanhada pelas escolas, é natural que em consequência da pandemia o número de alunos nestas circunstâncias tenha aumentado. A solução para o problema, como sempre, deve ser analisada caso a caso pelo respetivo conselho de turma. Para além da solução específica que em cada escola já antes tinha lugar, esta pode passar pela adoção das estratégias mencionadas nas alíneas a) e b) do ponto 2 deste texto.

 

Nota importante:

Considerando que tanto as sessões síncronas como assíncronas são preparadas e dinamizadas pelos professores, esse trabalho deve estar incluído especificamente nos respetivos horários de trabalho.

 

Regime não presencial de aulas

É evidente que as alterações impostas pelo regime não presencial de aulas tiveram um impacto significativo na vida profissional dos docentes.

A utilização de plataformas na modalidade de ensino à distância trouxe um conjunto de preocupações aos envolvidos no processo pelos riscos que se encontram bem tipificados no ponto 4 do documento emitido pela CNPD, com data de 8 de abril de 2020, intitulado “Orientações para utilização de tecnologias de suporte ao ensino à distância”.

Recomenda-se no citado texto “… que o Ministério da Educação, os diretores dos agrupamentos escolares e os diretores dos demais estabelecimentos de ensino, nos seus diferentes níveis, recorram a plataformas adequadas para garantir que os sistemas usados no ensino à distância não apresentam riscos para a privacidade para os alunos e professores” e ainda que “…toda a comunidade escolar siga as boas-práticas respeitantes à proteção de dados, designadamente abstendo-se de tratar dados pessoais que não sejam essenciais para a finalidade pedagógica, adotando comportamentos responsáveis quando disponham de acesso a dados pessoais de alunos, professores e outros titulares dos dados que possam incidentalmente ser visados por elas.”

Destas recomendações parece resultar que o uso das plataformas exige extremo cuidado e, embora a alínea a) do ponto 12 da RCM 53-D/2020 refira que cumpre ao estabelecimento escolar determinar a metodologia mais adequada para a realização das atividades letivas, o direito “… à autonomia técnica e científica e à liberdade de escolha dos métodos de ensino, das tecnologias e técnicas de educação e dos tipos de meios auxiliares de ensino mais adequados, no respeito pelo currículo nacional, pelos programas e pelas orientações programáticas curriculares ou pedagógicas em vigor”, consagrado na alínea c) do artigo 5º do ECD, não se encontra revogado pelo que deverá ser considerado no processo de escolha das escolas.

Neste contexto, é lícito exigir que a determinação pela Direção do uso de uma ou outra plataforma obriga-a, como responsável pelo tratamento de dados, a obter o consentimento dos utilizadores da plataforma e a garantir a conformidade com o RGPD, nomeadamente pela avaliação dos riscos existentes e pela implementação de medidas técnicas e organizativas adequadas. Deverá em consequência elaborar regulamento e/ou código de conduta para docentes, alunos, encarregados de educação e outros, no sentido de mitigar riscos e transmitir confiança aos visados.

No caso específico das sessões assíncronas que envolvam a transmissão de conteúdos editados para o efeito pretendido, para além de tudo o que já foi dito anteriormente, deve ser tido em conta que a única diferença entre esta modalidade e a publicação de um manual, em fascículos, com a matéria a lecionar num determinado ano de um ciclo de estudos é o suporte utilizado para divulgar o conteúdo. Por isso, não podemos esquecer que os docentes que criem estes materiais adquirem direitos de autor sobre os mesmos.