Cidadania e Desenvolvimento / Aprendizagens Essenciais
A Cidadania e as velhas ideologias
Joaquim Carvalho | Dirigente SPGL
Acudindo ao repto governamental da necessidade de quebrar as «amarras ideológicas» e acabar com a «ideologia de género» a que se prestava a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, o ministro Fernando Alexandre adere a um verdadeiro factoide político, curvando-se perante uma agenda que o posiciona algures entre o obscurantismo e o negacionismo. O pretexto era o de proteger os alunos de “temas complexos”. A tutela conseguia, de uma assentada só, descredibilizar toda uma disciplina e, uma vez mais, lançar o manto da suspeição sobre os professores.
Estamos, pois, perante um governo que cede a quem ignora que a Educação Sexual vai muito além da reprodução biológica. É ensinar a respeitar o próprio corpo e o do outro, a decifrar os sinais contraditórios da adolescência, a reconhecer limites e compreender que o silêncio não é consentimento. É, por exemplo, dar às crianças ferramentas para pedirem ajuda. É prevenir a homofobia e combater a violência sexual e de género. Ignorar isto é empurrar uma geração para a educação do TikTok. A quem tutela a educação em Portugal, exige-se mais responsabilidade.
No balanço final desta história, cremos que há algo de mais profundo e que merece a nossa denúncia. A necessidade de “libertar a disciplina de amarras ideológicas” é, na verdade, o engodo ideológico. A verdadeira estratégia está em aproveitar tudo que sirva para desviar as atenções da verdadeira tragédia em curso no ensino em Portugal: a exasperante falta de professores que coloca em causa as aprendizagens de milhares de crianças, hipotecando o seu futuro, condenando muitos ao ciclo perpétuo da pobreza e exclusão social.
O SPGL, como sempre, está ao lado dos professores e empenhado na defesa de uma escola pública democrática, solidária e feita para todos. Defender a liberdade de ensinar é assegurar o futuro dos alunos, é preservar a nossa dignidade coletiva. Uma dignidade que não sucumbe ao populismo, aos alarmismos artificiais ou à demagogia. A sociedade que queremos construir nasce da coragem de formar valores e, cada vez mais, da determinação em defendê-los.
Texto original publicado no Escola/Informação n.º 312 | setembro/outubro 2025