Artigo:ESCOLA INFORMAÇÃO DIGITAL Nº 4

Pastas / Informação / Escola Informação

Por que insistir nas Contratações por Escola?

A ideologia que professamos traduz o modo como nós gostaríamos que a realidade fosse. E militantemente procuramos que a realidade se transforme (ou se mantenha) para que o nosso desejo, mesmo que racional, se concretize. Mas se há coisa que a história nos ensina, é que dá sempre mau resultado deturpar a realidade em função das ideologias ou, mais prosaicamente,  em função do que proclamamos como “os nossos princípios”.

Nuno Crato está convencido de que é necessário substituir o processo “centralizado” da colocação dos professores conferindo a cada escola o poder de selecionar os seus docentes. A experiência destes dois últimos anos “mostra” porém que a colocação por escola é muito mais ineficiente do que a colocação por concurso nacional. Há dois anos, as arbitrariedades cometidas pelas direções das escolas/agrupamentos, traduzidas sobretudo nos critérios específicos de cada escola considerados para a graduação dos professores, obrigaram o próprio MEC a considerar ilegal um bom número de colocações obtidas por “colocação por escola”. O recurso aos tribunais por parte de alguns “visados” permitiu-lhes contudo suspender a decisão do MEC e continuarem num lugar que, com forte probabilidade, ocuparam ilegitimamente. Este ano a situação parece ter-se agravado: escolas/agrupamentos há em que critérios tão específicos permitem que docentes com muito menos tempo de serviço ultrapassem às centenas (ou mesmo milhares) candidatos com muito maior graduação profissional. Obviamente que são critérios “com fotografia”, como se costuma dizer.

De há uns anos a esta parte tem ganho espaço o mito da “autonomia das escolas”. Em seu nome, as escolas com “autonomia” – entendida como uma distinção e cada vez em maior número – e  as Escolas/Agrupamentos designadas por Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP) têm sido afastadas do concurso nacional de contratação dos professores.  Têm direito a selecionar os seus docentes. A prática mostra que este processo se tem revelado prejudicial para essas mesmas escolas que, na maioria dos casos, têm os docentes colocados mais tardiamente e escolhem entre os que não conseguiram ser colocados no concurso nacional… Isto é, não escolhem nada, a não ser os horários “reservados” para os seus amigos (que obviamente serão sempre os melhores professores do mundo…)

Se Nuno Crato não sobrepusesse a sua ideologia (ou os seus princípios) à realidade, reconheceria que o melhor para o país e para as escolas era aperfeiçoar o concurso nacional e fazer dele o modelo de colocação dos docentes, deixando a colocação “por escola” para casos pontuais. O seu espírito messiânico de grande descentralizador (lembremo-nos da sua vontade de fazer implodir o ministério) leva-o porém a prometer o impossível: garante que vai credibilizar as colocações por escola. 

O princípio de que é útil que cada escola possa escolher os seus professores é teoricamente defensável. Mas a história destes dois anos parece evidenciar que esse modelo não é aplicável no contexto português. Pelo menos por enquanto. Perante um conjunto de candidatos a um lugar numa escola, com que critérios é que ela faz a sua escolha? Primeiramente “por conhecimento pessoal”, talvez por “recomendação” do presidente da câmara e da freguesia que garantirá a qualidade do amigo, talvez pela Escola onde o candidato se formou, ou por morar mais perto… Idealmente até podemos admitir que exija aos candidatos provas práticas: dar aulas durante uns dias rotativamente a ver quem é o melhor…

Por outro lado, face à dificuldade de conseguir um lugar numa qualquer escola, o candidato ver-se-á obrigado a apresentar a sua candidatura a dezenas ou centenas de escolas, num processo infernal de entrevistas, de deslocações, de apresentação de currículos… (o que já hoje acontece nesta coisa das contratações por escola).

É urgente rever a legislação dos concursos, uma vez que 2015 será ano de concurso geral. A realidade parece impor que se regresse, melhorando, à colocação por concurso nacional para todas as escolas. Pode porém acontecer que a “ideologia” de Nuno Crato se sobreponha e ignore a realidade.  Provavelmente teríamos um ano ainda com maiores complicações nas colocações do que este. É que a realidade tem mesmo muita força.