Artigo:"O meu livro quer outro livro" - Conversa com Rui Vieira Nery

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"O Meu Livro quer outro livro"

Conversa com Rui Vieira Nery “Para uma história do Fado”

Fim de tarde cinzento, em Lisboa.
Depois das palavras de Teresa Santos a situar o trabalho e as diversas componentes do belíssimo currículo de Vieira Nery, nada melhor que ouvir o seu coração falar: “gosto de música, gosto de refletir e gosto de partilhar!”
E foi assim noite dentro que uma privilegiada sala cheia escutou, atenta e participante, um homem apaixonado pelo que faz, pelo que tem feito. E não parece ser pouco…
Com “um pai, guitarrista, dos melhores”, “uma mãe, fanática de ópera”, “um irmão amante de rock…”, nas palavras de RVN, como poderia ele passar sob esta chuva sem se molhar…, dizemos nós.
E com a maior naturalidade foi dedilhando a sua conversa, explicitando como chegou a esta obra “Para uma história do fado”, que só poderia constituir-se como uma abordagem histórica. E informou sobre as edições que já existem, além da versão em língua portuguesa, em italiano, francês, inglês, entre outras.
Mas foi uma noite também com surpresas. Os professores António Parreira e Guilherme Carvalhais e a também professora Adelaide Sofia, não só interpretaram fados, como exemplificaram alguns tipos: o fado corrido – o fado binário; o fado mouraria – uma marcha a 4 tempos; o fado que passa do dó maior para o dó menor – também ele corrido, mas “de estrofe em estrofe” a partir da mesma quadra.
E que bem “estilizados” que foram pela Adelaide!
Agradecendo estes belíssimos momentos, RVN referiu, e recordou-o por diversas vezes, o importante e minucioso trabalho de pesquisa e recolha desenvolvido pelo professor António Parreira desde músicas a letras de fados, versos estróficos, quadras de 7 sílabas, etc., etc… que se encontram hoje reunidos numa obra indispensável para qualquer estudo neste domínio.
O fado que vem do século XVIII, início do séc. XIX, mas que, frisou bem, “não veio do Brasil”. Muito «bebeu», no entanto, do vaivém de gentes idas e vindas, da música e dança populares brasileiras. Até ao final do século XIX o fado era dança cantada!
E, para melhor compreender o fado, convidou-nos a pensar na Lisboa do séc. XIX, nas pessoas que, com o desabrochar da época industrial acorrem a Lisboa e naquelas que vêm do Brasil e nas franjas de bairros populares que se formam na cintura de Lisboa: a cidade em contato com a zona saloia. O fado é a canção que nasce no seio da classe operária. Com o início do movimento operário começam a ser editadas muitas letras de fado e surgem os primeiros jornais do fado «Guitarra Portugal» e outros.
Distinguiu o fado oitocentista, um fado que vem das festas, que contava histórias, um fado associado ao crime, tipo “correio da manhã da época”…, do fado do século passado, este sim, um fado de saudade. Os primeiros fados eram acompanhados só por violas. Mais, foi ilustrando a sua bem construída e evolutiva “conversa”, com imagens e gravuras da época. E a componente histórica lá estava, nos retratos dos “retiros”, das tabernas, em regra espaços junto das estradas que ligavam os arredores ao centro de Lisboa, e das casas de fado, onde se “batia o fado”! E as fotos mostravam-no, com o “gingar”, o “bater o pé no chão”…
E partilhou mais: desde muito cedo, a literatura pega nas letras do fado e Eça utiliza-o como elemento de caracterização da personagem, por exemplo em «Eusébio Macário» e «O Primo Basílio».
Na década de 70 do séc. XIX o fado começa a “dignificar-se”, a ser encarado como “música chique” e a ser usado com fins políticos e os textos vão dando testemunho do próprio avanço do movimento operário. Na 1ª República é arma de crítica política. E, todos estes factos foram sendo documentados através da observação de gravuras da época e recortes da revista «Ilustração Portuguesa».
No início do séc. XX, o fado moderniza-se! Em 1906, aparecem os primeiros discos com gravações de fados. Os fadistas têm de ter “carteira profissional”, um requisito visando combater o preconceito do fado ser cantado por gente menos rica… Alguns cafés e restaurantes, caso do «Café dos Anjos», passam a ter fadistas contratados e os fadistas passam a cantar para um público que não é já da mesma classe social. A partir do 28 de Maio, os fados passam a ser objeto de censura e a necessitar do carimbo de aprovado na letra.
Começam a aparecer as Casas de Fado, o que leva os fadistas a dedicarem-se ao fado em exclusividade. O fado passa a ser um elemento fundamental da Revista. Até o primeiro filme sonoro vai buscar o tema da Severa.
E daí, foi um pulo até aos nossos dias: Amália aparece em 1938; em 1950 começa a cantar poemas de grandes poetas, em 1960 canta Camões.
O fado muda, surgem novos e diferentes intérpretes! É uma paixão!
Em 1999 é inaugurado o Museu do Fado! Em 2011 a Unesco declara o fado Património da Humanidade!
E esta “conversa” só acabou… porque havia um jantar/convívio entre os participantes.
Obrigado Rui Vieira Nery por continuar apaixonado!


Apresentação do Professor Rui Vieira Nery pela Professora Teresa Santos

Na qualidade de sócia deste sindicato , fui desafiada a fazer esta apresentação . Meu nome é Teresa Santos Sou professora de música e tenho por Rui viera Nery uma imensa consideração intelectual...
Lisboeta Rui Vieira Nery  nasce em (1957) Filho de Raul Nery (1921-2012 )guitarrista exímio.

Rui Vieira Nery  inicia  os seus estudos na Academia st Cecília , prossegue estudos musicais no conservatório (nas classes dos professores Melina Rebelo  ,Santiago kastner e prof .constanca capdeville )  fará  licenciatura em história e posteriormente o seu Doutoramento  em Musicologia nos Estados Unidos , Áustin...

Consultando a Pagina/ Universidade nova de Lx

Rui Vieira Nery /Professor associado Faculdade Ciências Sociais e humanas   
Apresenta de momento Cinco áreas de investigação         
1) musicologia  Histórica
2) Historia da Música Portuguesa e brasileira
3) Música antiga ibérica  e latino -americana 4)Música popular urbana
5) Políticas culturais

Nesta página Constam  (51)  Publicações relevantes
A Última delas a publicação  /" para uma História do fado" 1 ed. 2004 e  segunda edição 2012 -e ainda a   tradução francesa (2014)
Rui Vieira Tem uma igualmente uma  Experiência profissional Vastíssima

Já Na Pagina /GULBENKIAN podemo-nos aperceber que na qualidade de professor associado da universidade nova de lx , Rui Vieira Nery , orienta um vasto número de mestrados e doutoramentos em universidades portuguesas , espanholas e francesas.
E investigador do instituto etnomusicologia centro de estudos música e dança.

Na fundação Gulbenkian, foi director adjunto do serviço de música(1992 /2008) director do programa GULBENKIAN educação para a cultura(2008/2012) e é presentemente director do programa GULBENKIAN de língua e cultura portuguesas(desde 2012).

Ainda nesta página e Referida a sua atividade de crítico e colunista musical . Da conta da colaboração prestada regularmente com a antena 2 (radiodifusão  portuguesa )nos programas )"sons intemporais", "matrizes "e "ressonâncias".
Participou igualmente em diversos documentários televisivos para RTP, BBC, Rádio France , AL Jazeera , TV cultura e outras emissoras.
Foi condecorado em 2002 com a Comenda da ordem do Infante D. Henrique por serviços prestados à cultura,


Desempenha funções de secretário de estado da cultura entre 95 e 97 , atualmente e presidente da Assembleia Geral Da Sociedade Portuguesa de Autores.
Por último será de destacar a importantíssima contribuição que Rui Vieira Nery presta na consagração mundial e na subida de estatuto do fado a "patrimonio imaterial da Humanidade".(2011) Em 2012 recebe a medalha de ouro da cidade de Lisboa.
Em jeito de conclusão :
Rui Vieira Nery é um Investigador , professor e Homem da cultura incontornável , partilha estes conhecimentos através de inúmeras publicações , programas de TV, rádio , conferências , e promove esta partilha com o seu rigoroso conhecimento e sempre com enorme prazer .
consegue fazê-lo transversalmente, Convida todos e estabelece pontes entre o erudito,o popular o urbano ...
Promove esta partilha de uma forma  muito natural, verdadeira e competente , sendo que Deste modo obtém como resposta, o respeito e a forte admiração de toda a comunidade. ..
"Para uma história do fado" apresentado graficamente com  uma invulgar frescura acompanhada por textos /reflexões e pesquisas que revelam uma total imparcialidade, remete.nos para as origens do mesmo, explica.nos o seu desenvolvimento , faz justa referência a todos os que desta viagem tomam parte , e termina com uma reflexão até aos dias de hoje,com absoluto rigor histórico "Para uma história do fado" é seguramente  uma obra imprescindível na construção  da nossa identidade... Devera mesmo ser obrigatória em todas  as estantes das casas,  cujos leitores apreciem e defendam, ainda, a cultura em formato de papel...
Muito obrigada Rui Vieira Nery , resta-me fazer , uma última pergunta - com uma obra /curriculum destes, quantos mais desafios se seguirão?

Veja aqui a reportagem fotográfica